Num desses dias, alguém me perguntou como se deve proceder quando em
pecado. Respondi o óbvio: arrepender-se. A pessoa contestou dizendo que o
pecador também é vítima e precisa ser entendido como tal.
Essa me parece ser a discussão dos dias correntes: pecador ou vítima?
A
Bíblia reconhece que qualquer pessoa pode ser vítima do pecado de
alguém ou mesmo da conjuntura social, ou da estrutura
politico-econômico-social, porém, não entende que isso possa justificar
qualquer ato pecaminoso. Para a Bíblia todo ser humano é sujeito da e na
história, principalmente, de sua história. Todos são pessoalmente
responsáveis, ainda que possa haver atenuantes ou agravantes.
Para
a Escritura Sagrada o que se pede do pecador é que se arrependa, isto
é, que assuma o seu erro e a sua responsabilidade. Arrepender-se é
aceitar a punição da lei. Um pecador arrependido é aquele que admite
merecer a punição que a Lei de Deus prescreve para ele. Que, em última
instância, é a morte: “A alma que pecar, morrerá” (Ez 18.4).
O
Novo Testamento, entretanto, nos ensina que todo o pecador que se
arrepender, isto é, todo o que admitir e confessar o seu pecado será por
Deus perdoado, como ensina o apóstolo João (1 Jo 1.9). E, por ser
perdoado por Deus, deve ser perdoado pelo ser humano a quem ofendeu.
Entretanto, o pecador não tem como exigir o ser perdoado. O pecador pede
perdão, mas, não o exige; pelo simples fato de que perdão não é um
direito do pecador, é uma benesse do ofendido. Porque perdão é graça.
É
verdade que o cristão não tem como não perdoar (Mt 6.12). Contudo, essa
é uma questão entre a vítima e Deus. Além disso, o pecador não tem o
direito de reclamar do sofrimento de que foi acometido como consequência
de seus atos - no relacionamento ofensor e ofendido (isso não justifica
o ofendido, caso sua reação seja pecaminosa). É a lei da semeadura:
“Semeia-se vento, colhe-se tempestade” (Os 8.7). E é preciso que se diga
que, por pior que seja o sofrimento que o pecado venha a provocar sobre
o pecador, ainda é menor do que o Inferno ao qual ele fez jus.
Todo
o que confessa o seu pecado será perdoado e restaurado por Deus (1 Jo
1.9). Porém, confessar é assumir a responsabilidade e admitir a justiça
da punição pelo que fez. Ainda que a punição não virá pelo fato de já
ter sido sofrida por Cristo.
Nesta época tal reflexão está se
tornando impensável: porque vivemos numa era de vítimas. Hoje, não
importa o erro que a pessoa cometa, ela é sempre vítima: seja da
sociedade, seja da história, seja da economia, seja da política, seja
das instituições, seja da família. Ninguém é culpado. Logo, como alguém
disse: é uma época em que ninguém assume a responsabilidade, nem adia
prazeres e nem se presta a sacrifícios.
Essa época é pós-cristã
não porque não se fale mais de Deus (pelo contrário, provavelmente,
poucas vezes na história se falou tanto de Deus), mas, porque não se
fala e nem mais se admite a realidade do pecado. Esta é uma era onde não
há mais pecadores, só há enfermos. É o auge do humanismo: o pressuposto
de que o ser humano é intrinsecamente bom venceu; e, ora, gente
intrinsecamente boa não peca, adoece. E doentes são vítimas.
O
que ainda não se percebeu nesta presente época é que doentes não podem
ser perdoados. Só pecadores podem ser perdoados. Logo, só pecadores
podem ser restaurados; só pecadores podem ser tornados puros de toda a
injustiça que cometeram. O que será dos que estão prontos para assumir
que estão enfermos, mas, jamais que são pecadores? A probabilidade maior
é a de continuar pecando cada vez mais e pior, contraindo, aí sim, uma
doença para a qual não há cura: a voracidade de ser aceito de qualquer
jeito, por julgar ter o direito de ser de jeito qualquer. Essa
enfermidade coloca a pessoa a deriva dos mais grotescos apetites,
tornando-a escrava dos instintos, que se tornarão cada vez mais
irresistíveis. É a escravidão do pecado (Jo 8.34). E disso só se escapa
quando, finalmente, a todos os pulmões o pecador confessa: “Minha culpa,
minha culpa, minha máxima culpa”.
Texto publicado originalmente no portal Irmãos.com
__________
Ariovaldo Ramos é pastor na Comunidade Cristã Reformada e na Igreja Batista de Água Branca, ambas em São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
COMENTÁRIOS