O pastor deve manter-se longe dos perigos que ameaçam a integridade de seu ministério.
Samuel, filho do pastor da igreja da
qual eu era membro, conversava com seus colegas da escola sobre a
importância das profissões dos seus pais. Um gabava-se: “Meu pai é
químico; ele descobre produtos úteis para a sociedade”. Outro dizia: “O
meu é engenheiro. Ele constrói pontes e estradas”. Notando o silêncio
de Samuel, os colegas perguntaram-lhe: “E o seu pai, o que ele faz?” O
adolescente encolheu os ombros, meio encabulado, e confessou: “Meu pai
não faz nada – somente fala.”
Acredito que muitos pastores repassam a
impressão geral de que o líder de uma igreja tem uma vida isenta de
responsabilidades mais pesadas. Um colega, certa vez, me contou como
chegara a escolher a carreira de pastor. Quando jovem, ele passava na
frente da casa de um ministro do Evangelho. Observava que ele pulava da
cama depois das nove horas da manhã e, depois, seguia uma rotina bem
suave – ia pescar quando lhe convinha, conversava alegremente com os
amigos, era constantemente convidado para as celebrações das famílias da
igreja. Nas horas mais vagas, preparava uma homilia de vinte minutes
para o culto nos domingos. O jovem percebeu que aquele pastor era
honrado na sociedade e recebia um salário bom, e esta foi a vida que
escolheu para si.
Não me admirei em ouvir, tampos depois,
que aquele jovem, já guindado à condição de pastor, havia se divorciado
da esposa e seduzido a mulher de um líder da sua igreja. Acabou saindo
do país com ela, indo pastorear uma igreja no exterior, onde, quem sabe,
a história se repetiria. Acabei perdendo contato com aquele “pastor
lobo”, vestido de pele de ovelha.
Como ele, há muitos e muitos por aí.
Pastores que não fazem caso das exigências bíblicas para o pastorado,
especialmente aquela que requer que o bispo seja
“irrepreensível”(registrada em I Timóteo 3.2), são uma ameaça para a
igreja! O mais devastador dos perigos do ministério é a falta de
integridade, quando o pastor prega aquilo que não vive e ilude os
membros da igreja, fingindo ser um homem chamado por Deus. Quando a
igreja não tem um padrão de qualidade e não requer de seu pastor que
preste contas a alguém, há o perigo da preguiça. Gastar pouco tempo com
Deus ou imaginar que um curso de seminário é suficiente para o pastoreio
não qualifica ninguém para o ministério. Muitos pastores pensam que
nada mais é exigido do pregador senão de colecionar um acervo de boas
histórias e ler um texto da Bíblia para logo esquecê-lo, sem se
preocupar com o sentido da passagem ou como as Sagradas Letras deveriam
ser aplicadas às vidas de seus ouvintes.
GRANDE OBRA
O professor de um seminário pediu que
seus alunos procurassem saber dos membros de suas igrejas o que achavam
das pregações dos seus pastores. O consenso colhido foi o de que os
pastores leem a Bíblia, mas não a explicam, nem aplicam o texto para a
vida diária das pessoas. Outra conclusão do estudo foi a impressão
generalizada de que os líderes têm mais interesse nos negócios das
igrejas do que na vida espiritual dos membros.
Robert Murray McCheyne, um jovem pastor
de Dundee, na Escócia, e muito usado por Deus, disse: “A grande obra do
pastor, na qual deve depositar as forças do seu corpo e mente, é a
pregação. Por mais fraco, passível de menosprezo, ou louco (no mesmo
sentido como chamaram a Paulo de louco) que possa parecer, este é o
grande instrumento que Deus tem em suas mãos e para que, por ele,
pecadores sejam salvos e os santos sejam aptos para a glória. Aprouve a
Deus, pela loucura da pregação, salvar aos que creem. Foi para isso que o
nosso bendito Senhor dedicou os poucos anos de seu próprio ministério –
e esta foi a grande obra de Paulo e de todos os apóstolos. Por isso,
Jesus nos deu este mandamento: ‘Ide por todo o mundo e pregai o
Evangelho’.” Com efeito, o sucesso eterno do ministério de qualquer
pastor será medido pelo poder de sua pregação. Comentou Cotton Mather:
“O desenho e intenção principal do pregador é restaurar o trono e
domínio de Deus nas almas dos homens.”
Outro perigo envolve as finanças do
pastor. Raras vezes seu salário tem alguma folga. O cartão de crédito
parece ser uma providência divina para adquirir “necessidades” que
estouram o orçamento. Parece que o pastor acredita que os membros têm a
responsabilidade de socorrer ministros que gastam mais do que recebem.
Acontece que o que parece ao pastor ser uma necessidade não convencerá
os membros da comunidade, que via de regra vivem com salários inferiores
ao que seu pastor recebe. Se o dinheiro é a motivação, sua alegria não
virá do ministério, mas das coisas que pode comprar. Paulo combate esta
ameaça, dizendo: “Não devam nada a ninguém, a não ser o amor de uns
pelos outros” (Romanos 13.8). A integridade do pastor se reflete na
honestidade com que trata o dinheiro da igreja.
Uma pesquisa feita na escola de missões
do Seminário de Fuller, nos Estados Unidos, sobre a vida de 900 líderes
evangélicos, tanto na história como no presente, revelou que eles
reconhecem que a autoridade espiritual é a base principal do poder, isto
é, o impacto de um ministério que transforma vidas depende da
intimidade que o líder tem com Jesus. Essa intimidade se nutre através
de pureza pessoal, adoração e uma vida fiel de oração. Uma das
principais ameaças do ministério se revela no profissionalismo que busca
sucesso de outras fontes de poder. O líder cristão pode decidi
raprimorar-se na psicologia, na oratória ou com conhecimentos
intelectuais. Contudo, em qualquer outro foco de um ministério faltará a
vitalidade que somente o Espírito Santo é capaz de suprir. O exemplo do
apóstolo Paulo nos desafia a todos: “Aprendi o segredo de viver
contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com
fome; tendo muito, ou passando necessidade” (Filipenses 4.12).
Muitos ministros não sentem que a
tentação sexual possa ser problema. Pensam que esse tipo de atração pode
ser perigosa para os outros, mas não para eles. No entanto, a
lamentável frequência com que os escândalos têm abalado a reputação das
igrejas evangélicas sinaliza para a necessidade de cuidados especiais.
Paulo advertiu seu filho na fé nos seguintes termos: “Fuja dos desejos
malignos da juventude” (II Timóteo 2.22). Prevenção requer um plano
eficaz para repelir as tentações que assolam a vida de muitos pastores. O
texto coloca justiça, fé, amor e paz e, especialmente, a companhia de
pessoas que, de coração puro, invocam o Senhor como baluarte contra a
atração sexual pecaminosa.
A internet tem trazido para dentro de
casa a possiblidade de contaminar o coração do pastor com a pornografia.
Ainda que poucos ministros confessem esse vício secreto, a praga
moderna ameaça a estabilidade de muitas famílias e o relacionamento de
pastores com suas igrejas. Qualquer líder que não mantém a fé e a boa
consciência enfrenta o perigo de “naufragar na fé”, conforme Paulo
admoesta a Timóteo. Jesus ensinou que os puros de coração são felizes
porque eles verão a Deus. E que dizer do que maculam suas mentes com
pornografia?
AVALIAÇÃO CONSTANTE
De minhas muitas décadas de ministério
pastoral, tenho aprendido, continuamente, a desenvolver disciplinas
pessoais e espirituais que podem nos manter a salvo na questão da
integridade sexual. Em primeiro lugar, é preciso avaliar nossa condição
espiritual regularmente, sabendo que a falta de oração e comunhão com
Deus é fatal. Em segundo lugar, o pastor precisa manter um casamento de
qualidade, com comunicação, evitando sentimentos de descontentamento,
pobreza no relacionamento sexual e frieza na intimidade. Não se pode ser
omisso na busca por um bom relacionamento espiritual e emocional. Além
disso, é necessário, sempre, demonstrar respeito e amor, as chaves de
um casamento saudável. O servo do Senhor também precisa tomar precauções
básicas, fugindo de qualquer pessoa que o atraia sexualmente e evitando
aconselhamentos com pessoas do sexo oposto sem a presença do cônjuge. A
descoberta de um bom amigo com quem se possa abrir o coração para
revelar qualquer sentimento que não seja puro e saudável deve ser uma
prioridade. Por fim, deve-se ter em mente, sempre, o poder destrutivo
que uma queda no pecado sexual tem sobre ministério abençoado por Deus.
Na lista de qualificações que o pastor
deve ter, Paulo inclui o governo da família. O líder deve ter “os filhos
sujeitos a ele”. “Se não sabe governar sua própria família, como poderá
cuidar da igreja de Deus?”, questiona o apóstolo (I Timóteo 3.4,5)? Na
cultura brasileira, muitos pais não exigem a obediência dos filhos. O
individualismo reina de tal modo que os pais chegam a se cercar de
cuidados para não contrariar seus filhos. Todavia, a Bíblia ensina com
clareza que filhos e pais são pecadores. Todos necessitam disciplina
para aprender a obedecer aos pais, tal como os pais precisam de
disciplina bíblica para submeter-se a Deus. Por isso, Paulo faz a
conexão do líder responsável pela igreja e a responsabilidade de chefiar
a família.
Algumas qualificações são mais
determinantes do sucesso no ministério do que outras. Acredito que a que
mais importa para o pastor é o amor pelas pessoas e sua humildade, além
de coragem. Jesus convidou os cansados e sobrecarregados a aprender
dele a se tornaram humildes e mansos (Mateus 11.29). Se Jesus Cristo for
realmente o modelo que norteia o ministério, não há que se duvidar de
que essa qualidade tenha importância singular. Alguns pastores esquecem
que são ovelhas que também precisam do pastoreio do Bom Pastor (I Pedro
5.4). Essa atitude de altivez é especialmente perigosa nos tempos em que
vivemos, nos quais o sucesso ministerial é medido por números e marcas
externas de uma igreja. Jesus não teve um sucesso notável ou
popularidade. Tanto, que ele rejeitou a proposta do povo, que queria
aclamá-lo como rei (João 6.14).
Os líderes de igrejas no presente século
percebem que a liderança de uma comunidade de maneira bíblica ficou
mais difícil. Mas aqueles que combatem o bom combate, pregando a Palavra
e guardando a fé, receberão a coroa da justiça que o Senhor, o justo
juiz, lhes dará no dia final. O ministro que combater para vencer, como o
apóstolo Paulo lutou, receberá a recompensa prometida na vinda do
Senhor.
Russel Philip Shedd é
doutor em teologia com estudos de pós-doutorado em Novo Testamento,
escritor e conferencista. Americano radicado no Brasil desde 1962, é
presidente emérito de Edições Vida Nova e missionário aposentado da
missão World Venture.