NOSSA MISSÃO: “Anunciar o Evangelho do Senhor Jesus à todos, transformando-os em soldados de Cristo, através de Sua Palavra.”

Versículo do Dia

Versículo do Dia Por Gospel+ - Biblia Online

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Líderes para quê?

Para que formamos líderes? Acabo de preencher um formulário de recomendação para uma organização evangélica que respeito muito. Para minha surpresa, havia duas perguntas ao final acerca do suposto futuro potencial do candidato para “impactar a igreja global e a sua missão”. Desconcertado, hesitei em como responder. Não foi o exercício de “bola de cristal” que mais me incomodou. Foram as possíveis premissas por trás das perguntas que me fizeram duvidar dessa abordagem. Registro minhas dúvidas e preocupações em algumas breves considerações abaixo. Pense comigo.

Como meço impacto no reino de Deus?

Talvez alguém imagine mencionar as pessoas convertidas, o número de discípulos, a quantidade de leitores de um livro, a multidão alcançada pela mensagem pregada na igreja ou através da web, etc. Ainda assim, seria mesmo possível dizer que os números medem o impacto no Reino?

Às vezes vemos alguém realizando um ministério como se deve, inclusive podendo ser o melhor possível num determinado contexto. Mesmo assim talvez não consiga ver aparentes bons resultados vindos de seu esforço. Por outro lado, e isso é uma tragédia, é possível fazer algo de uma maneira errada, inclusive biblicamente falando, e ainda assim ver grandes números ou “resultados” desse tipo de trabalho.

Portanto, o meu ponto é: os números (ou os resultados) não nos contam toda a história. Temos de ser capazes de ler os números, interpretá-los, para que não sejamos levados por uma ideologia dentro da ênfase sobre os números. De certa forma, somos chamados a sermos fiéis, e não a sermos "bem sucedidos", sem nem bem saber o que essa última expressão significa.

Se não posso “medir” o impacto do trabalho de alguém no reino, mais difícil ainda seria prever o potencial e o impacto futuro da obra de alguém. De todo modo, preocupar-me com esse futuro traz suas próprias armadilhas. Isso porque eu não invisto minha vida em alguém para que ele ou ela venham a ser “grandes”, reconhecidos, mas para que sejam fiéis e instrumentos preciosos nas mãos de Deus. Só isso. Tudo isso.

É possível que estejamos estimulando motivações equivocadas?

Imagine que estabeleçamos um programa de formação com o objetivo de preparar “líderes de destaque” em qualquer contexto, seja nacional ou global. Que tipo de mensagem eu passo aos jovens que estão se preparando para servir melhor no Reino?

Meu ponto é que expressões como “líderes de impacto”, “vozes significantes” e “pessoas de destaque” não são expressões neutras em si. Elas são carregadas de conceitos e ideologias que lhes são associadas no mundo em que vivemos. Além disso, essa ideologia mundana não está só fora da igreja. Lamentavelmente, ela também está bastante imiscuída nos corredores das estruturas eclesiásticas onde nos congregamos e através das quais buscamos servir. Negar isso seria ingenuidade e entregar-nos à vil mentalidade do mundo.

Assim, cursos de formação de líderes em nosso contexto deveriam ter outro tipo de ênfase. Que sejam líderes formados para servir. Se devem crescer nos seus dons, ser mais eficientes, competentes e alcançar cada vez mais pessoas através do ministério em que estão envolvidos? Claro que sim! Se isso deve dar-se às custas de submeter-se às ideologias do poder, das supostas “avaliações objetivas” de impacto, da busca desmedida por reconhecimento público (leia-se, fama) e do perigo de serem descartados quando não são mais “eficientes”? Claro que não!

Líderes servos são, na maioria das vezes, anônimos. E é assim que eles devem continuar sendo. Como lidar então com o tipo de tensão apresentada por essa organização irmã na seleção de seus potenciais futuros líderes? Sugiro que sejam líderes formados com um profundo senso de privilégio por serem conscientes de que são recipientes da graça de Deus. Formados, não com a motivação para tornar-se “grandes líderes”, mas com uma paixão por servir onde quer que o Senhor os envie, em fidelidade humilde, e sem ambição de destaque ou reconhecimento humano. No final das contas, um “grande líder” é exatamente isso: alguém que chega a certas posições, ou provocando determinado impacto, justamente porque não ambicionou isso em primeiro lugar. Também inúmeras vezes nem chegaremos a ler as biografias de muitos “grandes líderes”. Porque eles podem ter servido, influenciado e promovido o reino de Deus em condições quase anônimas, sem holofotes, sem qualquer destaque ou reconhecimento. A motivação? A glória de Deus, o crescimento do outro e o avanço do reino. Foi nisso que eles colocaram seus corações. Daí a pergunta necessária: onde está o seu coração?


É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), e serve como secretário regional associado para a América Latina da Comunidade Internacional de Estudantes Evangélicos (CIEE-IFES)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

O trem bala da vida

Fiquei paralisado ao ouvir pela primeira vez a música "Trem Bala" de composição de Ana Vilela. Fiquei pensando como alguém conseguiu como uma poesia envolvente pode ajuntar conceitos profundos com uma melodia repleta de afeto. A parte mais tocante para mim é essa: "Segura teu filho no colo/ Sorria e abraça teus pais/ Enquanto estão aqui/ Que a vida é trem-bala, parceiro/ E a gente é só passageiro prestes a partir".
A música me levou a reflexão dos valores importantes para nossa vida. Afinal de contas, essa vida contemporânea marcada pela agitação e busca de realizações pessoais, esvazia nossos desejos de afeto em detrimento do sucesso pessoal e profissional. A canção diz "Não é sobre tudo que o seu dinheiro/ É capaz de comprar/E sim sobre cada momento/ Sorrindo a se compartilhar". A música me lembra de que o dinheiro é necessário e não prioritário, pois ele não compra um sorriso e um abraço.
A música me colocou diante da parede e paralisado pedi perdão e refiz meus planos para o ano que se inicia. Preciso separar mais tempo para "segurar meu filho no colo", preciso de mais tempo para "sorrir com meus pais e abraçá-los" antes deles partirem para a eternidade. Preciso aprender que necessito priorizar todos os queridos "enquanto estão por aqui".
Não sei a base religiosa da compositora, mas ela fala muito sobre teologia. A Biblia diz que a vida terrena aqui é passageira. A "vida é neblina", já diria Tiago (Tg 4:14). Moisés, homem de Deus afirmou que a vida é "como um breve pensamento" (Sl 90:9). A vida voa, e quando vemos já estamos envelhecendo e o tempo correndo a todo vapor. A vida é breve. A vida é um conto ligeiro, é de fato um trem bala.
O simbolismo do trem bala é a rapidez, e assim Ana Villela acerta em cheio afirmando com poesia que a vida é "trem bala parceiro", está passando cada vez com maior rapidez e nós distraídos com coisas efêmeras e fúteis. Nesse trem balda da vida " a gente é só passageiro prestes a partir". O trem sai da estação e começa a correria, assim é nossa vida. Da janela do trem vamos vendo paisagens e sentimos a brisa do vento e tudo passando de forma rápida.
Que nessa agitação dessa vida contemporânea, possamos valorizar o que de fato é importante, viver a partir do referencial do amor, pois frear a vida não é possível, paralisar o tempo como Josué também não, portanto, o que nos resta é ter a real noção de que a vida passa rápido, que nós estamos de passagem (e passagem rápida) e que precisamos priorizar o que é importante e terno: amar a Deus acima de tudo, amar o próximo (pessoas que circundam nossa vida) como a nós mesmos.
Parceiro (a) a vida é trem bala e nós somos passageiros. A bordo do trem bala, que é a vida, não fique olhando como o trem corre, mas corra na direção daqueles que estão abordo do trema da vida, abrace, beije, olhe nos olhos, conversa, curta a "chuva de vida que cai sobre nós". Sente-se e curta a sua viagem vivendo com Deus e para Deus, assim você priorizará o que Deus prioriza. Aproveite a canção e reflita. Reveja seus valores. Aproveite 2017.

 Jeferson Rodolfo Cristianini
  Bauru - SP

domingo, 29 de janeiro de 2017

“Tudo vai bem, quando tudo vai mal”?

No correr da história tem havido vozes que insistem em dizer que “tudo vai bem, quando tudo vai mal”. São vozes que desejam manter o “status quo” e não mudanças. Nenhum remorso, nenhum arrependimento, nenhuma confissão de fracasso, nenhuma reviravolta, nenhuma limpeza, nenhuma reforma são necessários porque “tudo vai bem”. Elas são incapazes de assumir o contrário, que tudo vai mal. Para essas pessoas o mundo vai bem, o país vai bem, a sociedade vai bem, a igreja vai bem, a economia vai bem, a moral vai bem, o casamento vai bem, a família vai bem e “eu vou bem”. Isso ocorre mais por causa de alguma estratégia oculta de ordem política, de ordem econômica ou de ordem religiosa, do que por causa da falta de atenção e observação. Os portadores da mensagem de que “tudo vai bem, quando tudo vai mal” pretendem fazer uma lavagem cerebral.

Como se pode dizer que o mundo vai bem se os atentados terroristas estão cada vez mais frequentes, mais sangrentos e mais ousados, principalmente na Europa? Se uma em cada 113 pessoas no mundo, no final de 2015, era refugiada ou deslocada ou estava em busca de refúgio em algum país? Se “estamos em meio de algo como uma verdadeira epidemia mundial de depressão que fez números insignificantes saltarem a proporções massivas” (Vladimir Safatle)? Se em abril de 2016, Barack Obama solicitou ao Congresso americano a aprovação de um orçamento de um bilhão e cem milhões de dólares para prevenção e tratamento do uso de opiáceos, e se 450 novas drogas sintéticas se juntaram às demais em 2014? Se o racismo ainda mata brancos e negros, menos de cinquenta anos depois da morte de Martin Luther King? Se “há uma enorme possibilidade” de Donald Trump, caso seja eleito presidente dos Estados Unidos, ter acesso aos códigos nucleares (Tony Schwartz)?

Como se pode dizer que o Brasil vai bem se “a Lava Jato ameaça transformar o país numa imensa jaula onde todos ficaremos presos e difamados” (Carlos Heitor Cony)? Se o Jornal The New York Times sugere que o Brasil deve ganhar a medalha de ouro em corrupção, e o ministro de nosso Supremo Tribunal Federal diz que a corrupção se tornou “uma espantosa regra”?

Como se pode dizer que o casamento e a família vão bem se “casamentos não mais são feitos para durar” e se “a traição conjugal virou vício” (Walcyr Carrasco)?
Como se pode dizer que a moral vai bem se comportamentos amorais são cada vez mais divulgados e ensinados sem o menor pudor? Se o beijo gay de 2014 é substituído agora por uma cena de sexo gay, tudo muito natural?

Por volta dos anos seiscentos antes de Cristo, quando os exércitos da Babilônia estavam bem próximos, quando Nabucodonosor armou aríetes -- máquinas de guerra para derrubar muralhas -- em torno de Jerusalém, quando a fome era tal que as mães matavam, cozinhavam e comiam seus próprios filhos -- os falsos profetas enganavam o povo de Israel dizendo “tudo vai bem, quando tudo vai mal” (Ez 13.10).
Por causa dessa mensagem sem cabimento, o povo não deu ouvidos às vozes de Isaías, Jeremias, Ezequiel e outros. Então, a guerra, a fome e a doença deram cabo deles!

Fonte: Revista Ultimato

sábado, 28 de janeiro de 2017

A missão do marido

Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, (Efésios 5:25)

Marido, a sua missão é amar a sua mulher. E o amor não tem tanto a ver com um sentimento, ainda que possamos considerar que o sentimento é o “recheio do amor”. No entanto, a substância elementar ou principal do amor é a ação. Um ato de amor gera um sentimento de amor, mas nem todo sentimento de amor, necessariamente, produzirá um ato de amor.
E a sua mulher precisa ser amada. Não apenas por palavras (por uma expressão sentimental da sua subjetividade), mas de uma forma concreta, visível, materializada, da qual ela não tenha dúvidas de que é amor de fato e de verdade. Entregue-se a si mesmo por ela.
E para que você ame a sua mulher, é preciso que você, primeiramente, equilibre o seu coração e a sua alma, porque você é um ser carente, muitas vezes agressivo, que foi criado numa cultura familiar em geral machista, que considera a mulher como um ser inferior. Você precisa deste equilíbrio que somente Cristo pode lhe dar.
Quando você, em fé e com humildade, olha para o amor d’Ele e para o que Ele realizou conforme a revelação do Evangelho, passa então a ter condições de agir em obediência ao que Ele realizou, imitando-o neste sentido para com a sua esposa, de modo que ela seja beneficiada.
Se Ele amou a Igreja e se entregou a si mesmo por ela, cumprindo assim a missão que Deus lhe deu, você irá imitá-lo e fará o mesmo por sua mulher. Você vai amar, se entregar, compartilhar e doar do melhor que tem – e o fará desinteressadamente, com toda a alegria no coração.
O resultado disso será a comunhão, a alegria mútua e também a consciência de se estar verdadeiramente fazendo a vontade de Deus.
“A vontade de Deus é que você faça a vontade de Deus”, diz Agostinho.
Muitos casamentos estão ruindo e se deteriorando porque falta o amor marital, exclusivamente por parte do homem. O homem pode salvar um casamento como pode destruí-lo. A mulher também. Mas Deus cobra muito mais do homem na questão do amor e da entrega de si do que da mulher, porque Ele sabe de sua natureza. Sabe que o homem tem dificuldades e precisa da sua graça e do seu poder para obedecê-lo, assim como a mulher tem dificuldades para se submeter ao seu marido conforme o Evangelho ordena, que não tem nada com a ideia de submissão desta secularidade. Mas o tema “submissão no casamento” fica para uma outra oportunidade.
Isto posto, que Deus possa, marido, revelar estas verdades ao teu coração, de tal maneira que você transforme cada palavra lida em ação na vida para que, na vida, seja experimentado tudo aquilo que Ele tem para ambos, por meio do casamento.
Assim devem os maridos amar as suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo. (Efésios 5:28)

 Por Maycson Rodrigues

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Onde as facções não têm vez

A revista Veja visitou a penitenciária onde o conhecido ex-goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes – condenado há 22 de reclusão pelo assassinato da modelo Eliza Samudio –, está preso e carrega as chaves da própria cela. Trata-se da unidade da APAC – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – em Santa Luzia, nas proximidades de Belo Horizonte. A matéria e a entrevista com o ex-ídolo do Flamengo foram publicadas esta semana.

Ultimato também visitou uma das 43 unidades da APAC no Brasil, na cidade de Itaúna, uma das unidades de destaque no país. Em 2015, o jornalista e fundador da revista Ultimato, pastor Elben César, passou dois dias com os ‘recuperandos’ e até dormiu nos aposentos da APAC. Confira a reportagem do “Mineiro com cara de Matuto”.


O Mineiro com Cara de Matuto na APAC de Itaúna

A ponte que Deus construiu para os criminosos chegarem a ele

Por Elben César


J. K. Rowling, autora da série Harry Potter, diz que “a pior coisa do mundo é o encarceramento”. E o autor da epístola aos Hebreus ordena: “Não se esqueçam daqueles que estão na prisão. Sofram com eles, como se vocês próprios estivessem aprisionados com eles” (13.3).

Por causa dessa passagem bíblica, o Mineiro com Cara de Matuto pediu a ajuda do advogado Antonio Carlos da Rosa Silva Junior, especializado em ciências penais e em direito e relações familiares e autor do livro “Deus na Prisão”, para ser preso por dois dias em uma penitenciária de Juiz de Fora, MG, a mais próxima de sua casa. Porém, Antonio Carlos achou por bem indicar não uma penitenciária, mas a APAC de Itaúna, uma cidade a 85 quilômetros de Belo Horizonte, onde fica a Universidade de Itaúna. APAC é a sigla de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados e tem como objetivo a humanização das prisões, sem perder de vista a finalidade punitiva da pena. Seu propósito é evitar a reincidência no crime e oferecer alternativas para o condenado se recuperar.

No dia 3 de novembro de 2014, o Mineiro apertou a campainha da APAC de Itaúna. Logo ao chegar, ele encontrou a voluntária Vera Lúcia, uma extrovertida cadeirante de 64 anos, formada em ciências econômicas, irmã de seis Marias e tia de duas gêmeas idênticas, formadas na Universidade Federal de Viçosa (UFV) e hoje missionárias católicas, uma em Luxemburgo e outra na Polônia. Ela tinha apenas 12 anos quando um caminhão em marcha a ré esmagou suas pernas.

A ala feminina da APAC

O contato que o Mineiro teve com as recuperandas do regime semiaberto foi muito positivo. Depois de ouvi-las, ele contou a história do desabafo de Ana, uma mulher que havia perdido a vontade de comer e tinha o semblante triste antes de chorar amargamente diante de Deus e de clamar a ele por se sentir desesperada com os problemas domésticos. Ele fez questão de frisar que o semblante de Ana não era mais triste depois de sua longa e fervorosa oração (1Sm 1.18). Depois, orou com elas e por elas.

Quase todas cumprem pena por tráfico de drogas. Mas Daiane, de 24 anos, assassinou o companheiro quando tinha 19. Ela está na APAC há quase quatro anos e tem mais sete anos e meio para cumprir a pena toda. Daiane parece muito sincera, tem buscado muito a Deus e confessa que ele “é a base de tudo na minha recuperação”. Mesmo detida, ela está fazendo um curso superior e procura se profissionalizar.

Ao lado de Daiane estava Savana, de 27 anos, casada, mãe de duas crianças. Ela conviveu num ambiente favorável ao crime desde a idade de 5, “amigou” e começou a traficar aos 12. Cumpre a terceira prisão. Jeniffer, de 31, tinha um bonito nenê de poucos meses no colo, que ela diz ser “o quarto e o último”.

O Mineiro se encontrou com estas mulheres numa varanda no andar de baixo da instituição. Elas estavam trabalhando em artesanato. Quando chegou ao andar de cima, onde ficam as recuperandas do regime fechado, elas estavam tomando café e comendo sonhos, feitos por elas mesmas. O que havia dito no andar de baixo o Mineiro repetiu.

O dinheiro fácil não é fácil


Quem abriu o portão para o Mineiro sair da residência das recuperandas (as palavras cadeia, prisão ou penitenciária são evitadas) foi Keila Cristina, uma mulher de 31 anos, mãe de três filhos e membro da Igreja Evangélica Betel. Ela permaneceu presa por quase cinco anos. Onze meses depois de solta, voltou ao tráfico e cumpriu mais três anos e meio de detenção. Hoje é encarregada da segurança na ala feminina. Quem levou o Mineiro de volta à ala masculina foi Maria Inês. Ela é apaixonada pela APAC e tem toda razão. Seu primeiro contato com a organização foi em 2010 como evangelista da Igreja Presbiteriana Renovada de Itaúna. Pouco depois, tornou-se funcionária, primeiro como plantonista, depois como motorista.

O recuperando Geraldo Magela, 30 anos, foi muito delicado com o Mineiro, conduzindo-o para aqui e acolá. Por sua aparência, ninguém desconfiaria que ele está há três anos privado de liberdade por causa de um assalto a mão armada ocorrido em Itaúna. O jovem está procurando a Deus porque “se nem um abutre sobrevive no deserto, muito menos eu sobreviveria sem Deus”. Geraldo afirma convicto que se o crime desse dinheiro ele seria milionário. Além de cuidar da cantina, o rapaz é presidente do Conselho de Sinceridade e Solidariedade da APAC masculina.

Depois do jantar, foi a vez de conhecer os aposentos dos apaqueanos do regime aberto. Eles podem passar o dia em liberdade, mas não podem beber nem usar qualquer tipo de droga e têm de estar de volta impreterivelmente às 19 horas. Ao chegar, passam pelo teste do bafômetro. Um deles, Reinaldo, de 39 anos, casado, cinco filhos, escreveu no questionário: “Hoje o crime não me seduz mais. Aprendi que o dinheiro fácil não é fácil. Ele me faz sofrer e leva ao sofrimento aqueles que me amam”. Outro, Michael, de apenas 19 anos, até parece conhecer a doutrina da justificação, pois diz que não pede perdão a Deus “porque ele já me perdoou”. De fato, Paulo explica: “Ao aceitar, pela fé, o que Deus sempre desejou para nós – consertar nossa situação com ele, tornar-nos prontos para ele –, alcançamos tudo isso com Deus por causa do nosso Senhor Jesus” (Rm 5.1). O problema é que, além do perdão por atacado, Michael e todos os viventes precisam continuamente do perdão diário (1Jo 2.1).

Uma porta, e não uma janela

Em 84 anos, foi a primeira vez que o Mineiro com Cara de Matuto dormiu num lugar do qual ele próprio não tinha a chave. No dia seguinte, 4 de novembro, antes de tomar café com os apaqueanos do regime semiaberto, ele fez a sua costumeira oração e leu o Salmo 132. O último versículo diz que a coroa do Filho de Davi “vai brilhar cada vez mais”. Então se lembrou de Provérbios 4.18-19: “A estrada em que caminham as pessoas direitas é como a luz da aurora, que brilha cada vez mais até ser dia claro. Mas a estrada dos maus é escura como a noite; eles caem e não podem ver no que foi que tropeçaram”. Ele tem certeza de que a APAC está ajudando de maneira correta homens e mulheres a sair da estrada escura e passar para a estrada cuja luz brilha cada vez mais.

No refeitório, ninguém foi tomando o seu café de qualquer jeito. Havia cerca de cinquenta pessoas. Todas obedecem ao ritual religioso de todas as manhãs: o cântico Bom dia, Jesus, a leitura de duas orações (a Oração do Amanhecer e a Oração do Recuperando), a leitura da passagem bíblica que fala sobre a plenitude da salvação (Fp 2.5-11), a recitação do Pai-Nosso e da Ave-Maria e a leitura do Termo de Adesão. Por ser algo repetitivo, é provável que nem todos percebam a riqueza das palavras cantadas e recitadas. No cântico Bom dia, Jesus, os recuperandos entoam:

Desviei do seu caminho
E caí na tentação
O Diabo me laçou
Mas Jesus me deu perdão!

Agora, estou liberto,
Vibrando com emoção,
De Jesus estou sempre perto
Com muita paz no coração.


Na Oração do Amanhecer, eles pedem: “Reveste-me da tua beleza, Senhor, e que, no decurso desse dia, eu te revele a todos”. Na Oração do Recuperando, eles declaram: “Senhor Jesus, tu vieste para salvar o que estava perdido, para dar chance de vida nova a todos, mediante o dom da tua própria vida, como holocausto pela remissão do mundo”. Na leitura do Termo de Adesão, eles repetem mais uma vez: “Firmo o presente termo comprometendo-me, assim, a não usar drogas e a lutar por todos os meios possíveis para que outros recuperandos não usem, além de vigiar diariamente para que não entre drogas na APAC”.

Na parte de trás da camiseta de um apaqueano estava escrita uma mensagem eufórica: “Eu pedi uma janela e Deus me abriu uma porta”.

O Jesus imatável

Logo após o café, o Mineiro leu para eles a palavra categórica de Jesus: “Ninguém tira a minha vida de mim, mas eu a dou por minha própria vontade” (Jo 10.18). Explicou que Jesus era imatável e só morreu na Sexta-Feira Santa porque se entregara por todos nós para tornar possível o perdão do Pai.

“O que vocês desejam mais: voltar para casa ou receber o perdão de Deus?” – perguntou o Mineiro. Sinceramente ou não, todos foram unânimes: “Preferimos o perdão de Deus”.

Percebe-se claramente a influência do evangelho no pensamento religioso de alguns recuperandos. Guilherme Lúcio, por exemplo, de 26 anos, evangélico, confessa-se pecador “desde quando nasci”. Ele e pelo menos outros dois (Adelson e Lucas) afirmam que a religião em si não salva ninguém. Outro evangélico de 19 anos completa dizendo que a sua recuperação depende de aceitar Jesus e caminhar com ele. Leandro Divino, de 30 anos, casado, pai de uma criança, não esconde que é um evangélico que “deixa muito a desejar”.

Algemas nunca mais

Logo após o demorado encontro com os recuperandos do regime semiaberto, o Mineiro subiu para o andar de cima onde ficam os do regime fechado. Na recepção estava escrito com todas as letras: “Na APAC as algemas só voltam ao seu pulso por sua livre e espontânea vontade”.

No auditório lotado, a professora Terezinha Morais da Silva dava uma aula de valorização humana, com auxílio de slides: “O pessimista sempre enxerga a vida com lentes embaçadas. Por isso para ele o tempo está sempre nublado”.

Quando ela abriu espaço para alguma manifestação dos recuperandos, Rubens, de 35 anos, casado, pai de gêmeas de 15 e de outra menina de 5, levantou-se e disse: “Precisamos acertar o foco – deixar de fazer a vontade da carne e fazer a vontade do Senhor”. Rubens contou ao Mineiro que era usuário de crack e traficante. Aos 32 anos cometeu homicídio e foi para a cadeia, onde ficou por um ano e meio e onde veio a se converter. Está na APAC há apenas oito meses. Não teria passado por essas desventuras se tivesse ouvido a esposa, que lhe pregava o evangelho.

Jadir Lázaro, 39 anos e quatro filhos, pediu ao Mineiro que fizesse uma oração por ele. Como muitos outros, ele tem uma história triste. Depois de trabalhar por dezessete anos na mesma empresa, numa única noite destruiu sua carreira e sua vida. Ele tem sete anos e meio pela frente.

Quando a professora, que é batista, terminou a aula, o Mineiro voltou a falar sobre o Jesus imatável, a mesma mensagem que havia pregado logo após o café.

Chega a exatos cem anos a soma das penas que somente os quinze recuperandos do regime fechado ainda estão devendo à justiça terrena. Tiago, de 25 anos, tem certeza de que só Deus pode tirar de sua mente todos os desejos malignos. Flávio, também de 25, deseja muito fazer parte dos 85% dos apaqueanos que não voltam ao crime para cuidar de seu filho, que tinha apenas 1 ano quando o pai foi preso e agora está com 8.

Ao descer do andar dos recuperandos do regime fechado, o Mineiro se encontrou com um dos cozinheiros, que lhe disse: “Hoje tem moqueca de peixe no almoço”. Ele se assentou ao lado de três rapazes do regime semiaberto e de duas funcionárias para almoçar. Não havia mesas só para os funcionários nem mesas só para os apaqueanos. Todos estavam juntos, inclusive a professora de valorização humana. Ninguém começou a comer antes da oração de gratidão e da recitação do Pai-Nosso. Depois do almoço e de uma esticada na cama, o Mineiro com Cara de Matuto se despediu da direção e voltou para Viçosa, dizendo com seus botões: “Bem-aventurada é Itaúna, não por ser conhecida como Cidade Universitária do Mundo, título conferido pela Unesco em 1975, mas por causa de sua pioneira APAC, que, devido a sua projeção nacional e internacional, é membro da Prison Fellowship International!”.

Texto publicado originalmente na edição 352 da revista Ultimato.

3 maneiras pelas quais o evangelho muda o casamento

Quando um novo líder é nomeado em uma organização, a mudança é inevitável. O novo chefe definirá a política, estabelecerá o tom e refletirá uma atitude em sua organização. O mesmo é verdade quanto aos nossos casamentos. O novo líder a quem me refiro aqui não é um novo marido, mas sim o verdadeiro marido, o Senhor Jesus Cristo.
Pelas Escrituras, nós sabemos que um casamento cristão nunca é simplesmente uma união de duas pessoas, mas duas pessoas unidas em Jesus Cristo. Esta é outra maneira de dizer que Jesus é a nossa cabeça, o Senhor e o que concede vida ao nosso casamento. Quando um homem e uma mulher abraçam a verdade do evangelho, seja na conversão ou na santificação, sempre há mudanças correspondentes relacionadas a Jesus ser o cabeça do casamento. Abaixo estão três das mudanças mais comuns que Cristo opera em um casamento enquanto o governa por meio do evangelho.
1. Do egoísmo ao serviço
Cada pecado flui do reservatório do eu. Nós abandonamos Deus e os outros em favor de nós mesmos. Isso é desastroso e doloroso. Em nenhum lugar essa inversão é mais evidente e prejudicial do que no casamento. Porém, quando o evangelho alcança o lar, há nítidas mudanças nesse contexto. A esposa irritável se torna paciente e bondosa com seu marido porque Jesus foi paciente e bondoso com ela. O marido autocentrado encontra mais alegria em aprender sobre os interesses da sua esposa do que sobre a história dos seus atletas favoritos. Isso é porque ele percebe que ela foi feita por Deus e para Deus, bem como a verdade que o Espírito continua a operar poderosamente mais de Cristo na vida da sua esposa. Isso é atraente e animador de uma forma que dribles e gols nunca podem ser. O evangelho alcança o lar e afasta os nossos corações de nós mesmos (egoísmo) em direção ao nosso cônjuge (serviço).
2. Da preguiça ao comprometimento
Se você não acha que a preguiça é um problema na América, considere o fato de que temos uma cadeira chamada “Rapaz preguiçoso”,#1 que é adaptada e comercializada para o homem americano. E ela vende! A preguiça, assim como o egoísmo, é inclinada para o eu, mas recebe as suas instruções de ação a partir do comando do conforto. Nós desejamos a comodidade e nos recusamos a fazer qualquer coisa difícil porque poderia ser desconfortável. A preguiça se relaciona principalmente sobre a preservação e promoção da percepção de conforto pessoal. E a preguiça mente muito. Sabemos que há um problema em nosso casamento, mas também sabemos que isso exige uma mudança, talvez até mesmo uma mudança dolorosa. Então, o que acontece? A preguiça diz: “Oh, eu farei isso em outro momento”. Ou a preguiça diz convincentemente: “Isso não é tão ruim. Eu ficarei bem”. Mas isso é a preguiça falando e não Jesus, o governador das nossas vidas. Sem dúvida, você pode imaginar como isso poderia minar o plano de Jesus para o crescimento e mudança em você e seu casamento. Mas quando o evangelho da graça alcança o lar, nos tornamos comprometidos em nosso casamento. Não somos mais espectadores passivos esperando manter uma cultura de conforto e segurança através da mediocridade disfarçada. Em vez disso, nos aproximamos do que Jesus é: buscamos a semelhança com Cristo por meio de, dolorosamente, mortificar o pecado.
3. Da justiça própria à humildade
A justiça própria é aquela mentalidade diabólica de que possuímos mérito em nós mesmos que nos recomenda diante de Deus e dos homens. Enquanto o egoísmo ama se retrair para o eu, a justiça própria ama se gloriar do eu. Em sua essência, isso se opõe ao evangelho que gira em torno da nossa necessidade e recebimento da justiça imputada de Cristo. A justiça própria em um casamento é tão sutil quanto uma sobrancelha erguida, enquanto a humildade é tão perceptível quanto a feição alegre. Durante uma discussão, uma esposa pode comunicar algumas preocupações ao seu marido. Se ele é justo em si mesmo, pode começar a contradizê-la com “dura” evidência. Se as coisas ficarem difíceis, seu ousado advogado interior articulará poderosamente a sua inocência enquanto também apresenta acusações contra sua esposa. A justiça própria no casamento está sempre na defensiva porque percebemos que sempre estamos sob ataque. Isso deve ser contrastado com o evangelho que nos ensina que já fomos suficientemente atacados, criticados e julgados. A cruz é o veredito. Nós somos culpados. Mas a beleza do evangelho é que, enquanto éramos infinitamente pecaminosos, também fomos profundamente amados. Isso produz humildade e segurança. Quando o evangelho alcança o lar em um casamento, nós silenciaremos mais rapidamente nossos advogados internos, enquanto desfrutamos a verdade do evangelho. É somente aqui que nós podemos, humildemente, crescer juntos na semelhança de Cristo.
Quando o evangelho vem ao lar e ao casamento há uma mudança definitiva no modo de funcionamento, tom e atitude. O casamento começa a ter as características do seu líder. No caso do evangelho, não pode haver melhor líder e nenhuma mudança mais importante para nós e nosso casamento.

Por: Erik Raymond. © Ligonier Ministries.Website: ligonier.org. Traduzido com permissão. Fonte: 3 Ways the Gospel Changes Marriage

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Bombeiros/BA anuncia concurso para todo estado

Os aprovados terão Curso de Formação e após o treinamento, os aprovados começarão a trabalhar em 2018, recebendo remuneração de R$3 mil, além de benefícios. A exigência para concorrer ao cargo é ter nível médio completo e idade entre 18 a 30 anos. A seleção contará com primeira etapa de prova objetiva, que abrange as matérias de Língua Portuguesa, Raciocínio Lógico­Quantitativo, História do Brasil, Geografia do Brasil, Atualidades, Noções de Direito Constitucional, Noções de Direitos Humanos, Noções de Direito Administrativo, Noções de Direito Penal e Noções de Igualdade Racial e de Gênero. “Em contato com a Rádio Recôncavo FM, o Tenente Coronel Matias, comandante do 16º grupamento de Corpo de Bombeiros informou que neste ano será realizado o concurso público regionalizado com 750 vagas para o estado da Bahia. Com pouco efetivo, o comandante disse que está buscando disponibilizar 60 vagas para Santo Antônio de Jesus. De acordo com ele, em torno de julho já deve começar os preparativos para a realização do concurso”. O último concurso realizado pelo Corpo de Bombeiros da Bahia ocorreu em 2008 e ofertava 400 vagas. O certame foi organizado pela Fundação Carlos Chagas (FCC), que aplicou provas objetivas e discursiva.

Ilusões sobre o casamento

Basta digitar “Preparando-se para casar” no Google e surgem inúmeros sites dando dicas incríveis para que tudo na cerimônia e festa de casamento saia impecável. Sem dúvida, muitas destas dicas são valiosas, facilitam a organização de um sonho do casal. Entretanto, o que me chama a atenção é que a preparação que um grande número de pessoas busca, geralmente está limitada à logística. Alguns casais se empolgam tanto com a ideia de viverem juntos que se limitam apenas à cerimônia. Depois, se dão conta de que o casamento não é a cerimônia em si; esta é somente um rito de passagem.

Raramente, nesta decisão, está incluído o cuidado com o preparo relacional do casal, com tempo para conversarem sobre assuntos tão relevantes que os acompanharão após o casamento como: o que é casar, suas diferenças, finanças, famílias de origem, espiritualidade, sexualidade, perdão...

Para muitos, assim que o sentimento de êxtase acaba o encanto pelo casamento também chega ao fim. O desencanto pode vir muito mais cedo do que se imagina. Não é raro eu ouvir de pessoas que já na lua de mel se arrependeram de terem se casado, e se perguntam o que fizeram com suas vidas.

Provavelmente você, assim como eu, também se depara com esta realidade ouvindo de amigos, parentes, conhecidos, testemunhos sobre os “preparativos do casamento”, ou talvez você esteja exatamente nesta fase que antecipa seu casamento vivendo a realidade de varias decisões e investimentos, porém sem investir em áreas tão importantes em seu relacionamento conjugal.

Ilusões sobre casamento
Por que isto é tão comum? Uma das causas se dá por muitos acreditarem que as pessoas já vêm prontas; por não se prepararem para casar e por não aprenderem antes de tomar a decisão, que casamento é investimento para a vida toda. Esta construção não se acaba. Você já imaginou uma construção durar 40, 50, 60 anos ou mais? Para uma geração que aprendeu a se relacionar na era digital pensar em algo que demora tanto tempo assim pode parecer utópico.

Eu me lembro na minha infância e adolescência meus pais compravam os objetos pela sua durabilidade e tinham orgulho de mencionar quanto tempo resistiam. Hoje, quando uma pessoa vai comprar um celular, um carro, um eletrodoméstico compra pelo seu design, eficiência, mas não raramente com a sensação de que está comprando algo que já está obsoleto ou assim será em breve. Esta proposta do marketing, de criar uma insatisfação constante tem se transferido para nossas relações pessoais. Algumas pessoas já entram no relacionamento com medo de que surgirá alguém mais interessante, que lhe dê mais satisfação.

Lamentavelmente a maioria dos casais entra em um relacionamento sem se dar conta da importância deste preparo que antecede ao casamento. Como já disse, casamento não é algo acabado; ele passa por várias etapas e fases relacionais, assim como o desenvolvimento humano.

Quando pergunto aos casais o porquê de se casarem, geralmente as respostas são: para realizar um sonho, paixão, gravidez, medo da solidão, ter filhos... as motivações não param por aí. O perigo é que muitas vezes estas motivações estão fundamentadas na crença de que o casamento proporcionará estas conquistas, e por isso os cônjuges se tornarão pessoas felizes. Cada vez mais as pessoas colocam uma expectativa no casamento, fazendo destas conquistas um fim para suas felicidades.

Quem não quer ser feliz? Porém, o grande perigo é quando as pessoas acreditam que casamento será um remédio que trará felicidade. Aqui vai uma alerta para quem está pretendendo se casar: casamento não é remédio que traz felicidade, não é cura para a solidão ou solução para problemas. Se casamento fosse remédio para solidão, não haveria casado infeliz.

Talvez esta crença venha de uma maneira tão sutil que a gente nem se dá conta, quem nunca ouviu a frase “Quando casar sara...”? Infelizmente alguns líderes delegam aos futuros cônjuges a tarefa: “Façam um ao outro feliz”.

O casal que entra num relacionamento conjugal pensando desta forma corre o risco de entrar para a estatística dos casamentos fracassados.

O que fazer então? É importante ser uma pessoa feliz antes de se casar e casar-se com uma pessoa que seja feliz. Não espere que o outro seja responsável por sua felicidade. Esta deve ser fruto de uma realização pessoal, alcançada pela obediência e pelo entendimento de que cada um foi criado com dons e talentos dados por Deus, de maneira singular.

Se a pessoa não cumpre primeiramente o seu chamado individual, dificilmente conseguirá cumpri-lo como parte de um casal. Ela irá se sentir frustrada e certamente responsabilizará o seu cônjuge por sua infelicidade.

Carlos McCord afirma: “Casamento não gera felicidade. O casamento apenas revela a existência ou não de uma felicidade preexistente, que é compartilhada pelo casal. Nunca observei duas pessoas infelizes se casarem e produzirem duas pessoas felizes”.

Outro paradigma é o da pessoa acreditar que encontrará a sua “outra metade”. Fico impressionada quantas pessoas ainda são reféns de uma crença como esta. Quantas mensagens, músicas e poemas que reforçam esta ideia. Cada um é uma pessoa por inteiro. Quando Deus criou o homem e a mulher, os dotou de capacidade e potencial, portanto cada pessoa tem a responsabilidade de viver a vida da melhor maneira possível.

Antes de casar
A proposta do livro Antes de Casar é ser uma ferramenta para ajudar a muitos casais que estão pensando em se casar a iniciarem um diálogo sobre vários temas que estarão presentes na construção do relacionamento. Sem dúvida alguma, pensar em se casar é pensar sim em todos e detalhes da cerimônia ou sonhar com a vida a dois, mas tomar decisões requer habilidades, como por exemplo: alinhar o desejo de um casal quando um deles pensa em morar numa casa espaçosa e o outro se sente muito inseguro e prefere morar em um apartamento; decidir em relação à igreja que irão frequentar se cada um dos noivos frequentam igreja ou denominações diferentes ou talvez até mesmo sejam crenças diferentes; como serão as datas comemorativas em relação às expectativas das famílias de origem? Como irão gastar ou investir suas finanças agora a dois? Quantos filhos desejam ter? E quanto tempo pretendem aguardar depois de casados para engravidarem? E se não puderem ter filhos, quais seriam algumas possibilidades?

A palavra “conversar” vem do latim (“conversare”), que significa “mudar juntos“. A boa conversa produz mudanças. Quanto mais cedo alguém tem consciência de sua motivação para se casar, mais consciente tomará esta decisão.

A ideia principal do livro é que todo relacionamento conjugal deve ter Cristo como centro, ou seja, que a fonte de satisfação e alegria de cada um deve ser encontrada em Cristo, e não esperando que o futuro cônjuge o faça feliz.

O encontro de Jesus com uma mulher de Samaria junto ao poço revela esta verdade. Veja a história em João 4.15-18 e o ensino do próprio mestre. Ela já estava no seu sexto relacionamento e não era uma mulher satisfeita. Depois do encontro com a fonte da vida, ela saiu repartindo o amor. O casamento necessita que a fonte de cada um dos cônjuges esteja em Jesus.

Portanto o propósito principal do casamento não é ser feliz. É amar para que a imagem de um Deus invisível se faça visível num ambiente de perdão, fidelidade, paciência, perseverança, bondade. Desta forma os filhos aprenderão relacionamentos saudáveis e a terra terá boas sementes.

Fonte: Revista Ultimato

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Família, meu maior patrimônio

A família está sendo atacada com rigor desmesurado por aqueles que deveriam protegê-la. Os legisladores, os governantes, os magistrados, a imprensa, a mídia, a academia, os formadores de opinião, em vem de fazer uma cruzada em favor da família, muitas vezes, drapejam suas bandeiras contra ela. Querem desconstruí-la. Querem acabar com o gênero. Querem confundir os papéis. Querem jogá-la na região cinzenta do relativismo absoluto. Querem zombar da honra e aplaudir o vício. É lamentável que aqueles que legislam, governam e julgam, não raro, não manifestam qualquer compromisso com os castiços valores cristãos que forjaram, guiaram e protegeram a família ao longo dos séculos. Destruir os fundamentos da família, entretanto, provoca um colapso na própria sociedade. Lutar contra a família, como legítima instituição divina, é conspirar contra nós mesmos, é declarar uma guerra insana para a nossa própria destruição.
Destaco aqui três pontos para nossa reflexão.
Em primeiro lugar, a família é nosso maior patrimônio porque foi instituída por Deus para o nosso maior bem e a nossa mais plena felicidade. A família é ideia de Deus. Nasceu no coração de Deus, no céu, na eternidade. O mesmo Deus que instituiu a família, estabeleceu princípios para governá-la. Deus criou o homem e a mulher, instituiu o casamento e uniu-os numa relação de plena comunhão emocional, espiritual e física. O casamento, segundo o preceito de Deus, é heterossexual, monogâmico, monossomático e indissolúvel. Consequentemente, a relação entre homem e homem, entre mulher e mulher está em aberta oposição aos preceitos divinos. No casamento deve prevalecer o amor e a fidelidade, a fim de que a intimidade física seja desfrutada com pureza e deleite. Só dentro dessa perspectiva, a família pode cumprir seu desiderato, e dar ao mundo uma descendência santa.
Em segundo lugar, a família é nosso maior patrimônio porque é guiada por Deus para cumprir sua vocação no mundo. A família tem o papel de criar filhos no temor de Deus, para cumprir no mundo seu mandato cultural e espiritual. Mesmo vivendo numa sociedade decadente, a família deve ser governada pela santidade. Mesmo vivendo numa cultura de relativismo, a família precisa viver dentro das balizas da verdade absoluta. Nossos filhos são herança de Deus e devem merecer nossa maior atenção. Os filhos são como flechas na mão do guerreiro. Os pais carregam os filhos e depois os lançam para longe, na direção do projeto de Deus. Nossos filhos devem cumprir o plano de Deus e serem vasos de honra nas mãos do Altíssimo. Nossos filhos devem ser reparadores de brechas e portadores de boas novas de salvação. Devem contribuir decisivamente na construção de uma sociedade mais humana, mais justa e mais solidária.
Em terceiro lugar, a família é nosso maior patrimônio, porque é um presente de Deus que devemos cuidar com o máximo desvelo. Seria uma consumada insensatez gastarmos nosso tempo correndo atrás de coisas, relegando nossa família a um plano secundário. Nenhum sucesso compensa o fracasso da família. Construir o sucesso pessoal sobre os escombros da família é loucura. A vitória sem a valorização da família tem sabor amargo. Devemos dedicar o melhor do nosso tempo e o melhor dos nossos recursos na formação espiritual, moral e intelectual da família. Investir na família é investir em nós mesmos. Semear nesse canteiro fértil é a garantia de uma abundante colheita. Quando a família vai bem, a igreja é edificada. Quando a família vai bem, a Pátria é bem-aventurada. Quando a família vai bem, os céus se alegram com a terra. Quando a família vai bem, todos, irmanados, caminhamos rumo à bem-aventurança!

Fonte: Hernandes Dias Lopes

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Ame e odeie o mundo

“Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia...”  (2 Tm 4.10)

Há uma grande diferença entre amar toda a criação de Deus e amar “este século” (ou ao “mundo”, palavra que ainda nos causa confusão). Defino aqui mundo como a produção humana e seu conjunto de experiências que acabam tornando a vida uma loucura, sem espaço para Deus; uma auto-suficiência idólatra onde as pessoas agem como se elas fossem deuses, criando um sistema de vida viciado na busca pelo prazer individual e no pleno exercício da ganância; o humanismo secular.
 
Logo, alguns concluem que devemos nos proteger de toda essa mazela mundana. A implementação disto seria, portanto, viver em uma comunidade isolada e cujo centro é a estrutura eclesial. Criaríamos um gueto alternativo que se exime dos processos da vida social, à margem dos espaços públicos de construção e manutenção, visto que são estruturas possuídas pelo maligno e se envolver implicaria em apaixonar-se por elas, em se misturar com o profano. Sem falar na perda de tempo em tratar de assuntos que não os levaria a um encontro com o “divino”. Outra consequência seria o esmagamento das culturas, a demonização das expressões artísticas e o empobrecimento intelectual. O que resta é uma espiritualização mística doentia fruto de uma polarização platônica e maniqueísta, onde tudo que de louvável existe está no metafísico.
 
Tudo isto não passa de um grande equívoco. O medo da vã paixão não pode paralisar o amor pela criação de Deus, nem deve ser desculpa para nos eximirmos de nossa co-responsabilidade na redenção de todas as coisas. O verdadeiro amor é capaz de nos mobilizar para superar o medo e seguir adiante, exercendo nossa mui santa vocação cristã: a de transformar a sociedade.
 
Lutamos pela transformação da sociedade não porque estamos apaixonados por este mundo, mas porque o cidadão do Reino deve provocar uma influência benéfica natural no lugar onde está. Faz parte de quem o cristão é agir de forma construtiva, sinalizar o Reino e a esperança através do amor. A misericórdia ativa e globalizada está no “DNA” dos filhos de Deus.
 
Somos tentados diariamente a agir como Demas (2 Tm 4.10), a abandonar o front, esquecer da realidade futura do reino. Esquecemos que há um lugar preparado para nós ao qual nenhum lugar se compara e que nenhum homem é capaz de conjecturar. Somos tentados a esquecer que as estruturas deste mundo devem ser transformadas porque são más, que sua aparente beleza e auto-suficiência não passam de engano mortal.
 
Nosso lugar não é na fuga alienante da realidade, mas também não é na paixão por ela (ou na suposta possibilidade de viver uma vida maravilhosa distante de Deus), mas na intervenção transformadora, cumprindo o propósito para qual fomos criados, que é caminhar com o mestre fazendo boas obras de misericórdia.
 
Não amar este século não quer dizer renunciar à felicidade, tampouco deixar de apreciar o que é belo nesta terra, mas saber admirar a criação sem se deixar dominar por ela. Aproveitar cada segundo desta vida olhando através das lentes do próprio Criador, e estar pronto para deixá-la quando Ele assim o quiser. A espiritualidade cristã consiste em humildemente amar a si e amar toda criação de Deus, sem a pretensão de ofuscar o brilho da glória de Deus, de onde emanam todas as coisas realmente belas. 
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Eric Rodrigues, 27 anos, é pastor anglicano, obreiro da escola Avalanche Missões Urbanas, articulador da Rede FALE e faz parte da coordenação estadual do Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL)

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Em meio ao caos, atenha-se às palavras de Deus

 "Céus e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão". (Mateus 24:35)

Queridos irmãos,
A cada dia vemos nos noticiários mais e mais tragédias e coisas ruins acontecendo pelo mundo. Além dos desastres naturais, percebo que as atitudes negativas estão tomando cada vez mais espaço, o que é uma preocupação muito grande para nós, que almejamos nosso lugar no paraíso e seguimos os ensinamentos de Deus.
Parece que a maioria das pessoas se esqueceu de ouvir a mensagem que está muito clara na bíblia, de amor e compaixão. Muitas estão nervosas e tristes, quando não estão completamente perdidas, trilhando um caminho que, sabemos, não as levará à salvação. Pelo contrário, vivem momentos de ódio, maldade e perdição na terra.
Por isso, hoje mais do que nunca, bato na tecla do diagnóstico, pois assim como é feito na vida financeira, é preciso analisar de que forma cada um de nós está levando a vida, se estamos contribuindo ou agindo para amenizar esse cenário perturbador. Precisamos retomar nossos sonhos, objetivos de vida, e nos dedicarmos a eles, sempre respeitando e amando não só a Deus, mas também nossos irmãos.
Vamos colocar em prática o que já sabemos na teoria: perdoar, acolher, cuidar… tudo se resume a amar, já que é de amor que as almas têm sede. Apenas assim estaremos caminhando para um futuro melhor, no qual poderemos olhar para trás e ver que semeamos coisas boas. Atitudes como essas consolidam a trilha que nos levará ao paraíso, enquanto lutamos por uma vida digna na terra.
Sou um educador financeiro e tenho consciência de que o dinheiro é só uma ferramenta, algo que devemos administrar com consciência sim, mas nunca deixar que seja o mais importante em nossas vidas; a ambição é um dos mais terríveis pecados capitais. Não nos deixemos levar pelos males mundanos, aproveitemos a mudança de ano para renovar também a vibração de nossas almas.

Por Reinaldo Domingos

domingo, 22 de janeiro de 2017

Importa o que os outros pensam de mim?

O medo do homem e o julgamento
O medo do homem quase sempre termina com o julgamento sobre os outros, porque nós começamos a supor que conhecemos as motivações, pensamentos, caráter e intenções da outra pessoa. Alguém esquece de responder um e-mail, então você presume que não é uma prioridade e que a pessoa é egoísta. Acontece que ela estava de férias. Você passa por alguém no corredor, e a pessoa não acena, então você deduz que ela não gosta de você ou é mal-educada. Acontece que a pessoa não a viu. Você convida alguém para fazer alguma coisa, e ela gentilmente recusa, então você presume que ela está decepcionada com você. Ocorre que ela apenas não quer participar ou está doente ou ocupada. Não importa, na verdade, o que a outra pessoa pensa ou faz, porém a nossa obsessão com a preocupação relacionada ao que as outras pessoas pensam sobre nós nos leva a julgar de maneira pecaminosa.
O medo do homem e o autoesquecimento
Os falsos pensamentos que nos levam a julgar os outros são uma forma de orgulho capaz de ser remediado somente pelo que Tim Keller chama de “a humildade que brota do evangelho”. Conforme ele explica em seu valioso livro Ego Transformado :
A humildade do evangelho mata a necessidade que tenho de pensar em mim. Não preciso mais ligar as coisas à minha pessoa. Essa humildade dá fim a pensamentos como: “Estou nesta sala com essas pessoas. Isso faz com que eu seja bem visto por elas? Estar aqui me faz bem?”. A humildade baseada no evangelho significa que não relaciono mais cada experiência e cada conversa à minha pessoa. Na verdade, deixo de pensar em mim mesmo. É a liberdade que vem do autoesquecimento. É o descanso bendito que somente o autoesquecimento nos oferece. [Timothy Keller, Ego Transformado: A humildade que brota do evangelho e traz a verdadeira alegria (São Paulo: Vida Nova, 2014), 34].
A preocupação com o que os outros pensam é orgulho. Talvez, você anseie ser respeitada. Talvez, você odeie a ideia de ser mal-entendida (Ah! Como penso nisso!). Seja o que for, trata-se de orgulho, e nós sabemos que Deus se opõe aos soberbos (Tg 4.6).
Todo cristão verdadeiro almeja a humildade que brota do evangelho. Nenhuma de nós deseja permanecer onde está – queremos ser transformadas à semelhança de Cristo. Os cristãos não desejam desobedecer a Deus e entristecer o Espírito Santo. Além disso, não é divertido ser consumida por aquilo que você acha que a outra pessoa pensa. Keller compartilha o segredo para o doce esquecimento que encontramos no evangelho:
Você já notou que é somente no evangelho de Jesus Cristo que o veredito é dado antes de desempenharmos nossas ações? [… ] No cristianismo, o veredito leva ao desempenho. Não é o desempenho que leva ao veredito. No cristianismo, no momento em que cremos, Deus afirma: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo”. Vejamos também Romanos 8.1 que diz: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”. No cristianismo, assim que cremos, Deus nos imputa as ações perfeitas de Cristo, seu desempenho, como se fossem nossas e nos adota como filhos. Ou seja, Deus pode nos dizer exatamente o que disse a Cristo: “Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo” [Estou retratando Keller, Ego Trasnformado: A humildade que brota do evangelho e traz a verdadeira alegria (São Paulo: Vida Nova, 2014), 42].
O veredito do “muito bem” está dado, e, como resultado, você e eu damos início à corrida da fé, despojando-nos do julgamento e do medo do homem. Mesmo, lamentavelmente, fracassando no futuro, esforçamo-nos ainda assim. Afinal, o “muito bem” de Deus motiva e inspira uma vida consagrada para a sua glória.
Eu gostaria de poder dizer que a luta contra o medo do homem e contra a tentação de julgar as outras pessoas é fácil, mas não é. No entanto, podemos estar certas de que Deus realmente completará a boa obra que começou em nós (Fp 1.6). Trata-se de uma caminhada de fé, uma corrida em direção à linha de chegada, a qual nos fará passar da luta contra o pecado e contra a tentação para a glória. Um dia, nós estaremos com o nosso Salvador, adorando a ele por toda a eternidade. Nunca mais adoraremos o ídolo do homem.


Por: Trillia J. Newbell. © 2016 Editora Fiel. Original: Importa o que os outros pensam de mim? Usado com permissão.

sábado, 21 de janeiro de 2017

A ciência e a sabedoria

Para todos os efeitos, esse artigo vai se limitar a interpretação formulada durante a Idade Média, não se envolvendo com a variada terminologia – na maior parte das vezes divergente – que abrange a Filosofia da Linguagem, a epistemologia atualmente e a reboque, a Teologia.
Esse binômio, cunhado desde a Idade Média, remete com certa naturalidade – devido talvez a vasta bibliografia consolidada a respeito –  a fazer uma associação genuína entre a filosofia e a teologia. Embora essas disciplinas estejam muito bem delimitadas para nós leitores e estudiosos contemporâneos das Escrituras Sagradas, nem sempre foi assim.
A distinção entre um e outro conceito, a saber,  sabedoria e ciência, é um tema que vem se desenvolvendo e sendo debatido desde o período em que a Filosofia Medieval estava em franco desenvolvimento e a Teologia era ainda uma relativa novidade como disciplina acadêmica. Dado que não havia a delimitação clara entre filosofia e teologia, os autores medievais preferiam tratar por philosophia Christi (a filosofia de Cristo) textos relacionados à espiritualidade, tanto que muitos textos que somos levados a crer como teológicos tendem muito mais a exortações morais ou reflexões sobre as Escrituras.
Para o próprio Agostinho de Hipona, o termo teologia soaria completamente estranho, se comparado ao conceito estabelecido atualmente. No seu antológico livro “A Cidade de Deus”, ele estabeleceu um contraste entre a philosophia Christi e as três esferas da teologia pagã do filósofo Varro:
Teologia Civil, que era focada nas atividades de culto de vários grupos cívicos e étnicos;
Teologia Mítica, que englobava os mitos que tratavam dos deuses cantados por poetas como Homero e Hesíodo;
Teologia Natural, que considerava os argumentos dos filósofos a respeito da existência e natureza dos deuses.
Muito embora a Teologia Natural provesse argumentos tipicamente filosóficos que poderiam adequar-se ao pensamento cristão, Agostinho resistia quanto à proeminência que pudessem ter entre os cristãos tal qual o faziam os filósofos pagãos. Ele pensava numa espécie de escala hierárquica, cujo ápice deveria coincidir unicamente com a elucidação das Escrituras, sem espaço para nada além disso. Sobretudo, ele não negava a força e a importância de uma argumentação sólida e bem estruturada herdadas da filosofia, porém seu uso deveria se restringir, no máximo, a aclarar e servir de apoio no entendimento da Revelação Divina.
Os temas da sabedoria (sapientia) e ciência (scientia) dominavam e usufruíam de grande atenção até mais que a teologia e filosofia enquanto disciplinas distintas no Período Medieval.
Para uma elucidação satisfatória será preciso, a partir desse ponto, um certo grau de abstração, demonstrando como se estruturava o pensamento de Agostinho, para que a conclusão seja tão consistente quanto possível, mas sua compreensão deve ser compensatória ao final.
Agostinho propunha uma visão do mundo, se assim poderia dizer, em três divisões hierárquicas; com o Deus Criador no topo, logo abaixo, no espaço intermediário, ocupado pelas criaturas angelicais e as almas, incluindo a mente humana; e na base – ou hierarquicamente na posição mais inferior – estaria a vastidão do mundo físico, mas ainda assim, boa, porque criada pelo Deus que é sumamente bom. Para cada um desses níveis corresponderia uma relação, ou princípio que explicaria sua estrutura e como os entendemos.
No nível do mundo físico ou natural, ele identificou os “princípios seminais“, plantados por Deus no mundo criado e que dirigiam o desenvolvimento dos corpos físicos. No nível da mente de Deus, ele identificou os princípios eternos (rationes aeternae) tais como protótipos para tudo o que Ele cria. Como pensamentos da mente divina, eles são imutáveis, necessários e eternos.
Entre os níveis inferiores e superiores da realidade, no nível intermediário da realidade estariam as inteligências angelicais e a ratio hominis, ou a alma racional humana. A posse de uma alma racional não só  distingue a essência humana e a inteligibilidade da natureza humana, como também torna a mente humana capaz de entender outras coisas das esferas da realidade, tanto acima como abaixo.
Dada sua posição intermediária, essa alma racional é capaz de entender as criaturas do mundo físico ou natural através da ratio inferior (razão inferior ou razão direcionada às coisas inferiores), bem como contemplar as razões eternas através da ratio superior (razão superior ou direcionada às coisas superiores).
Enquanto o objetivo da razão superior é a sabedoria (sapientia) alcançada através da contemplação, o objetivo da razão inferior é o conhecimento das coisas no mutável mundo do tempo (scientia). Esse tipo de conhecimento é mais restrito que a sabedoria e sujeito a erros, no entanto imprescindível para a vida prática.
Para Agostinho a sabedoria já estaria mais associada ao conhecimento da eterna e imutável verdade procedente da mente de Deus. As coisas temporais estão ligadas ao tempo, sua corrupção e constante alteração, antagonizando com a contemplação das coisas eternas. O primeiro ligado à ciência  (scientia) e o segundo à sabedoria (sapientia).
Quando um discurso se refere às coisas temporais, corruptíveis e passageiras ele se refere à ciência, no entanto, quando ele se refere às coisas, não pelo que foram ou deveriam ser, mas pelo que são e continuarão sendo, permanecendo inalteradas e imunes à corrupção do tempo, se refere à sabedoria.
Coisas eternas permanecem, não como algo fixado em algo, perceptível tal como um objeto, mas como algo inteligível percebido na natureza incorpórea; tão evidentes à percepção da nossa mente tanto quanto as coisas visíveis e tangíveis o são para os nossos sentidos.
Posto que esse é o julgamento correto sobre a distinção entre a sabedoria e a ciência e que o conhecimento intelectual das coisas eternas pertence à sabedoria e o conhecimento racional pertence às coisas mutáveis e corruptíveis, fica fácil deduzir por qual deles deveria ser a preferência do cristão, quando nesse impasse.
Uma outra conclusão de Agostinho é que a mente humana precisa estar em harmonia com as ideias eternas – a saber o que procede de Deus – para conhecer qualquer verdade necessária que seja. Já a ciência seria aquele conhecimento metódico sobre a verdade, quando muito, das coisas desse mundo que se mantém em constante mudança, por essa razão que a vida voltada para o conhecimento das verdades eternas (sabedoria) é superior à que se dedica ao conhecimento das coisas passageiras desse mundo.
A superioridade da sabedoria está sobretudo na importância do seu fim último. Ora, a partir dessa articulação, o percurso natural e evidente é o desmembramento que ocorre a partir dessa hierarquização dos tipos de conhecimento que acaba por subordinar a razão à fé. Porém Agostinho nunca repudiou a razão em favor das emoções pura e simples, antes sua proposta vinha para definir uma rota segura pela qual o cristão poderia trilhar na esperança e certeza de atingir uma vida plena em harmonia com as Escrituras Sagradas e o desejo do Eterno.
Sua famosa abordagem sobre a “fé em busca da compreensão” (fides quaerens intellectum) sintetiza ambos os conceitos não como antitéticos, mas mostra uma concepção na qual um conhecimento profundo da realidade seria o fruto proporcionado pela fé.
De certo modo a ciência deveria conduzir à sabedoria, mas infelizmente, são muitos os que se perdem pelo caminho, apostatam da fé e terminam como incrédulos porque deixam os ruídos e apetrechos do mundo entulharem corações e mentes, não sobrando espaço para o conhecimento real e verdadeiro que não se corrompe, a saber, o conhecimento do Eterno.
Não é à toa que o Salmista séculos antes já havia identificado isso: “Minha boca falará de sabedoria, e a meditação do meu coração será de entendimento” (Salmos 49:3).





Bibliografia
Cochrane, Charles Norris. Christianity and  Classical Culture: A Study of Thought and Action from Augustus to Augustine. Indianapolis, IN: Liberty Fund.;  2003.
Randles, W. G. L. The Unmasking of the Medieval Christian Cosmos, 1500–5000: From Solid Heavens to Boundless Aether. Aldershott: Ashgate; 1999.
O’Daly, Gerard. Augustine’s Philosophy of Mind. Berkeley, CA: University of California; 1987.
O’Connell, Robert. The Origin of the Soul in St Augustine’s Later Works. Bronx, NY: Fordham University Press; 1987.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Um raio-x da juventude evangélica brasileira

Há algumas semanas acompanhei um fórum num grupo batista de debates no qual se questionava se os jovens fazem ou não diferença na vida da nossa denominação. Não escondi minha empolgação por saber que, naquela ocasião, os olhos de muitos se voltavam especialmente para a juventude. Porém, a empolgação foi logo substituída por outro sentimento: preocupação. Sim, pois naquele debate vi a realidade de nossa juventude ser exposta diante de uma acurada análise. E os resultados não foram os mais satisfatórios.

Embora existam boas e louváveis exceções, uma das principais marcas da geração atual é a pouca resistência aos efeitos da pós-modernidade. Vemos, de norte a sul do país, juventudes inteiras desmotivadas e pouco comprometidas com Deus, sua Palavra e sua Igreja. Numa espécie de raio-x constatamos que a maioria dos jovens dá pouco ou nenhum valor a questões como vocação e espiritualidade. Sonham e vivem hoje exclusivamente em prol da profissionalização e de inesgotáveis graduações. Estas são as “bolas da vez”. Uma espécie de segunda “descoberta da pólvora”. Já o reino de Deus cai sempre pra escanteio e vira, inevitavelmente, segundo plano.

E a espiritualidade deles, onde fica? Boa notícia: ela não acabou nem morreu. Está apenas num estado de “hibernação”. Quando o inverno das buscas profissionais e intelectuais passar, eles planejam despertar. Sejamos francos: há sim um desejo múltiplo de “adoração”, só que quase sempre (e apenas) por meio de “louvorzões”, congressos, festivais, gincanas etc. Contudo o cultivo de valores cristãos na vida pessoal é algo cada vez mais raro. Há pouco ou quase nenhum interesse pela genuína Palavra de Deus.

Lamentamos ainda por saber que, embora tendo um número razoável de jovens como membros de nossas igrejas, eles não representam ainda sólida e significativa expressão nem para a vida denominacional nem para o país. Nossa relevância para o Brasil varia entre discreta, despercebida e inexistente...

Mas nem tudo está perdido. O lado bom da análise nos faz vislumbrar uma juventude que, embora não sendo 100% ativa, traz sobre si altíssimo potencial. Nossas igrejas são verdadeiros celeiros de jovens que têm em si muita capacidade e desejo de servir ao nosso Deus, e que apenas precisam saber quais os principais meios para fazê-lo. E os principais responsáveis para que estes potenciais sejam transformados em ação concreta são nossos líderes denominacionais (locais, estaduais e nacionais).

Com vistas a essa realidade, propomos a cada líder, em qualquer esfera em que esteja servindo, a se empenhar (ou continuar se empenhando) para mudarmos esse quadro.

Que a nossa geração possa deixar bons frutos. E que esses frutos gerem outros. Que marquemos a nossa geração não apenas sendo contados junto àqueles que são, diariamente, consumidos pelos efeitos da pós-modernidade. Que a nossa maior glória não seja apenas ser conhecidos como jovens de destaque na medicina, engenharia, docência e tantas outras ciências. Mas que sejamos conhecidos, principalmente pelas gerações que nos sucederão, como verdadeiros adoradores do Deus vivo; como servos fiéis do Senhor da seara. Porque, no final das contas, descobriremos que isso é o que realmente vale a pena.

Deus tenha misericórdia de nós e nos abençoe neste propósito. Jovens, lutemos juntos pela salvação do nosso povo. Eles não podem mais esperar. É tempo de avançar por amor aos brasileiros!


Francisco Helder Sousa Cardoso é presidente da Juventude Batista do Pará. fheldersc@yahoo.com.br 

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Apocalipse 21

João, o autor de Apocalipse, tem uma visão na qual o próprio Jesus aparece e o manda escrever em um livro sobre as coisas que ele vai ver e ouvir. Depois João teria que enviar este livro às sete igrejas da província da Ásia que estavam sofrendo perseguição. A primeira visão que João tem é do Jesus ressuscitado, que foi morto, mas que agora vive para sempre (Ap 1.18). Existe uma conexão muito clara entre as cartas enviadas às sete igrejas da província da Ásia, nos três primeiros capítulos e o restante do livro. As cartas são uma introdução pessoal e personalizada para cada uma das igrejas. Ou seja, cada repreensão e consolo contidas nessas cartas seriam melhor compreendidas quando eles escutassem toda as visões descritas no livro de Apocalipse. Outra função dessas cartas introdutórias seria lembrar-lhes que eles eram parte de uma comunidade (Ap 1.4, 11), que eram amados por um Deus que se preocupa com eles e os conhece.

No capítulo 21, João descreve a visão de um novo céu e uma nova terra. É interessante que ele começa a descrição dessa visão com a palavra: “depois”. Reconhece que outras coisas aconteceram antes. Ou seja, há uma conexão entre a realidade que havia “antes” ou “agora”.

Depois de uma batalha épica (o Armagedom), depois da condenação eterna de Satanás, depois do juízo final das nações. Depois são descritos novos céus e nova terra. Há esperança, há um novo começo. O autor começa a descrição de um lugar onde a justiça vive, onde não existe o mal. Nos fala de esperança e nos lembra das promessas que Deus nos havia dado. “Pois eis que eu crio novos céus e nova terra; e não haverá lembrança das coisas passadas, nem mais se recordarão.” (Is 65.17). “Nós, porém, segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e uma nova terra, nos quais habita a justiça.” (2 Pe 3.13).

João foi testemunha ocular de promessas que foram cumpridas em Jesus. E nessa visão de novos céus e nova terra, Deus mostra a João o que Ele ainda vai fazer. E que Ele vai cumprir suas promessas, como cumpriu a promessa do Jesus ressuscitado.

Não é uma visão estática, é interativa. O protagonista é Deus Yavé, que proclama com forte voz desde seu trono: “Aqui está o lugar onde Deus vive com os homens. Viverá com eles, e eles serão seus povos, e Deus mesmo estará com eles como seu Deus” (Ap 21.3).

Uma promessa repetida muitas vezes no Antigo Testamento, que anuncia a formação de um povo constituído por pessoas de todas as nações, raças, povos e línguas, vivendo juntos em paz (Ap 7.9).

E eu amo o versículo 21.4! Deus afirma que ele secará nossas lágrimas (Is. 25.8; Ap 7.17). O Senhor do universo, o Cordeiro cuidará de cada um nós.

A visão também descreve o que não vai mais acontecer:
Não haverá mais guerras (21.3-4)
Não haverá mais opressão econômica (21.3,4)
Não haverá mais violência familiar (21.4)
Não haverá mais o mar (21.1), de onde vêm os monstros, sinal de opressão e isolamento
Não haverá mais morte (21.4)
Não haverá mais luto (21.4)
Não haverá mais pranto (21.4)
Não haverá mais dor (21.4)
Não haverá mais noite (21.25)
Não haverá mais medo (21.25)

Entretanto, a visão não descreve apenas o que não haverá mais. Também descreve o que vai acontecer e o que já está acontecendo.

Para que seus ouvintes não tenham dúvidas, João repete que quem fala: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap. 21:5) é aquele que está sentado no trono.

Acho interessante que, no versículo 5, o verbo está no presente: “faço” ou “estou fazendo” novas todas as coisas. Nos versículos 3 e 4, os verbos estão no futuro. Nos versículos seguintes, 6 e 7, também. Ou seja, o “já” (o que o Senhor está fazendo no presente) e o “ainda não” (o que o Senhor vai completar no futuro).

Com isso não sobra espaço para ficarmos acomodados e esperarmos passivamente a segunda vinda de Jesus. A declaração do próprio Deus que Ele está fazendo e faz todas as coisas novas nos impulsiona, nos dá coragem e nos capacita a fazer as coisas de uma maneira diferente.

A ordem das palavras, no versículo 5, está invertida: novas todas as coisas. Enfatiza que há uma nova realidade sendo criada por Deus. Esta declaração confronta a minha resignação e apatia, me impulsiona a lutar pela justiça, a viver de maneira digna do evangelho. E a ter esperança apesar do sofrimento e da maldade. Porque a palavra final não vem da maldade no mundo. A palavra final vem da boca do Jesus ressuscitado que diz: “faço novas todas as coisas”.

A visão também desafia nossa compreensão da abrangência da salvação. Confronta-nos a não reduzir a salvação a um nível exclusivamente pessoal (restauração da relação pessoal do indivíduo com Deus) ou, ir ao outro extremo e reduzi-la a um compromisso político ou ecológico. O texto bíblico deixa claro que a salvação engloba todas estas dimensões:

Redenção do cosmos: novos céus e nova terra (v.1)
Redenção da polis, da cidade: a nova Jerusalém que desce do céu (v.2)
Redenção da comunidade, de um povo, constituído por diferentes grupos étnicos (7.9), vivendo juntos em paz (v.3, 4)
Redenção da relação pessoal do indivíduo com Deus (v.7)
Redenção que vem de Deus, da Sua presença e por causa de sua presença.

A visão não termina aí. Os versículos 8 e 27 falam sobre a justiça, de que o pecado não entra na nova criação de Deus. São versículos fortes e que podem parecer um pouco “discriminatórios”. Mas ao mesmo tempo, nos dão esperança porque no fim a justiça vai ser feita. Essa mensagem está conectada com os sofrimentos e tragédias que os destinatários desse livro sofrem. A visão aponta que não vai mais haver sofrimento, porque as coisas erradas não vão entrar no novo céu e na nova terra.

É interessante que o texto bíblico também esclarece que não são os “bons”, os que fazem boas obras que vão entrar na nova cidade, mas sim aqueles que têm seus nomes escritos no livro da vida do Cordeiro (Ap 21.27b). Como Jesus tinha lembrado a João e aos outros discípulos quando eles voltaram contentes de sua viagem missionária bem-sucedida (Lc 10.20).

 Ruth Borges é casada com Ricardo Wesley e mãe de Ana Júlia e Carolina. A família trabalha como missionários entre os estudantes universitários no Uruguai.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

A encarnação de Cristo, por C. S. Lewis

Chegamos à época do Natal em que celebramos a encarnação de Deus em forma de homem. Mas será que em meio a tanta festa, temos consciência do significado mais profundo desse evento histórico, particularmente para a vida cristã?

C.S. Lewis sistematizou as implicações do fato de Deus ter nascido em forma de homem em seu capítulo de “Cristianismo Puro e Simples” que fala dos “obstinados” (tradução antiga que eu prefiro) ou “teimosos” (tradução atual) soldadinhos de chumbo. Para início de conversa, ele pede para lembrarmos de nossas fantasias de infância em que imaginamos nossos brinquedos ganharem vida, como no Toy Story. É essa a implicação da encarnação na vida do cristão: ela faz com que, de soldadinhos de chumbo, nos tornemos seres de carne e osso, mesmo à nossa revelia. A vida cristã é toda uma história de pinóquios, que sofrem das dores da encarnação ou mutação decorrente da vivificação.

Esse processo já foi iniciado em nosso favor. Não temos nada a fazer pela nossa salvação, ela é dada pela graça. Nosso papel é permitir o processo se dar, como no caso da transformação do Eustáquio- dragão de volta em menino (“A Viagem do Peregrino da Alvorada”).

A limitação da imagem do soldadinho de chumbo é a abrangência e alcance do evento único que ocorreu no nascimento virginal, que contagiou toda a massa da humanidade e do universo. Por meio da encarnação, da morte e da ressurreição veio a salvação para toda a humanidade. Ser cristão é deixar-se contagiar por esse processo de libertação e santificação.

Em “Perelandra”, a segunda obra da trilogia espacial de Lewis (que começa com “Longe do Planeta Silencioso” e termina com “Uma Força Medonha”), o nascimento de Maleldil em forma humana foi um evento que repercutiu em todo o universo e seus planetas.
Ou seja, um ser absoluto desceu ou se tornou em um ser inferior para lançar nele a centelha da vida divina, reacendendo o seu lado espiritual que estava morto desde a queda. E esse processo permitiu que nós, cristãos, nos tornássemos, por imitação, “pequenos cristos”, ou seja, que participássemos da natureza divina de Cristo, inclusive de sua missão redentora.

Não há lugar em que Lewis expressa essa ideia de forma mais clara do que nas “Crônicas de Nárnia”, em que usou do recurso da suposição para imaginar como seria a encarnação em um mundo como Nárnia. E inventou que ela se daria na forma de um leão, um ser ainda mais elementar do que o ser humano.

Não é por acaso que Aslam faz questão de se apresentar em toda a sua materialidade às crianças e personagens de Nárnia. Nós sentimos o seu bafo, seu pelo macio, suas patas - ora macias, ora ferozes - e a força de seu rugido. Não se trata de nenhum ser meramente espiritual, mas material e corpóreo.

Ele não é uma divindade distante que resolve tudo na base da “patada” e do rugido, embora tivesse o poder para isso e eventualmente também usasse a sua ferocidade, mas dá a sua vida voluntariamente para pagar a dívida da traição, vence a morte e decide fazer as crianças e os animais falantes participarem do seu plano de resgate de Nárnia.

Vale nesse sentido citar a fala do leão que foi convidado a liderar uma batalha ao lado de Aslam em “O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa”:

– Ouviu o que ele disse? Nós, os leões! Ele e eu! Nós, os leões! Por aí você vê por que eu gosto tanto de Aslam. Não se põe lá em cima, não é de bancar o importante. Nós, os leões! Ele e eu!

Esse é também o sentido da polêmica vinda do Papai Noel na terra onde é sempre inverno e nunca Natal desde a chegada da Feiticeira Branca, que coincide com a vinda de Aslam. Ele traz presentes, que são ferramentas e não brinquedos, que ajudarão as crianças a participarem das batalhas em defesa de Nárnia.

Desejo que esse seja o espírito que contagie as comemorações de Natal desse ano de 2015: o da imitação de Cristo e da participação, no sentido da comunhão amorosa que é a marca da igreja em meio a um mundo em que é cada vez mais inverno e menos Natal.


É mestre e doutora em educação (USP) e doutora em estudos da tradução (UFSC). É autora de O Senhor dos Anéis: da fantasia à ética e tradutora de Um Ano com C.S. Lewis e Deus em Questão. Costuma se identificar como missionária no mundo acadêmico. É criadora e editora do site www.cslewis.com.br

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Conselhos para sobreviver ao mundo gospel

O mundo gospel se torna cada dia mais patético: distante do protestantismo, em rota de colisão com o cristianismo apostólico, transformado numa gozação perigosa, adoecendo e enlouquecendo milhares que são moídos numa engrenagem que condena a um duplo inferno.

Não consigo responder a todas as mensagens que entopem minha caixa postal. Milhares pedem socorro. Eu precisaria ter uma equipe de especialistas, todos me ajudando a atender os que me perguntam: "A maldição do pastor vai pegar mesmo?", "É preciso aceitar as patadas que recebo do púlpito?", "Em nome da evangelização devo aturar esses sermões ralos?".

Realmente não dá mais. A grande mídia propaga o que há de pior entre os evangélicos como petição de dinheiro, venda de "Bíblias fantásticas", milagres no atacado e simplismos hermenêuticos. As bobagens alcançaram níveis intoleráveis.

O que fazer? Tenho algumas idéias.

Aconselho que os crentes parem de consumir produtos evangélicos por um tempo. Não compre Cd de música ou de pregação -- inclusive os meus. Deixe os livros evangélicos encalharem nas prateleiras -- idem, para os meus. Depois que baixar a poeira do prejuízo, ficará notória a diferença entre os que fazem missão e os que só negociam.

Não vá a congressos -- inclusive o que eu promovo. Passe ao largo dos "louvorzões". Não sintonize o rádio. Boicote todos os programas na televisão. Não comente, nem critique, a pregação de pastores, bispos, evangelistas e apóstolos. Afaste-se! Silencie! Desintoxique mente, alma e espírito de linguagem, pressupostos e lógicas da "teologia da prosperidade". Volte a ler a Bíblia sem nenhum comentário de rodapé. Alimente seu interior em pequenos grupos. Reúna-se com gente de bom senso.

Estanque seus dízimos e ofertas imediatamente. Repense com absoluta isenção onde vai dar dinheiro. Mas prepare-se; no instante em que diminuírem as entradas, os lobos vestidos de pastor subirão o tom das intimidações. Não tenha medo.

Faça essa simples auditoria antes de investir o seu suor em qualquer igreja ou ministério:

- Quanto tempo é gasto no culto para pedir dinheiro?
- A hora do ofertório vem acompanhada de uma linguagem com "maldição, gafanhoto ou licença legal para ataques do diabo"?
- Promete-se "prosperidade, colheita abundante, bênção, riqueza" para os que forem fiéis?
- Existe alguma suspeita na administração dos recursos arrecadados? (Lembre-se que há dois níveis de integridade: o ético e o contábil. Não basta manter os livros em ordem; o dinheiro também só pode ser gasto no que foi arrecadado.)

Se a resposta para alguma dessas perguntas for sim, ninguém deve se sentir culpado quando não der oferta.

Só haverá arrependimento no dia em que os auditórios se esvaziarem junto com uma crise financeira. O monumental ufanismo evangélico precisa deflacionar.

Concordo, ninguém agüenta o jeito como as coisas estão.

Soli Deo Gloria. 

 Ricardo Gondim é pastor da Assembléia de Deus Betesda no Brasil e mora em São Paulo. É autor de, entre outros, O Que os Evangélicos (Não) Falam e Eu Creio, mas Tenho Dúvidas — a graça de Deus e nossas frágeis certezas.
www.ricardogondim.com.br

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Sacerdotes, Uber e Reforma Protestante

Estamos vivendo em um momento que pode ser chamado de uberização da sociedade. A palavra não é reconhecida como expressão válida da língua portuguesa pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP), mas tem sido amplamente usada para descrever um novo conceito de fazer negócios que conecta consumidores com produtores de bens ou prestadores de serviços de forma mais rápida e sem intermediários. O termo é uma alusão ao mais conhecido aplicativo para conectar pessoas a proprietários de automóveis que oferecem transporte alternativo aos convencionais. Apesar de ser o mais polêmico, o Uber não é o único aplicativo do gênero e nem o transporte urbano é o único setor atingido por essa transformação. Isso tem reflexos em diversas áreas profissionais e é um caminho sem volta. As pessoas estão se aproximando do que precisam por meio desses aplicativos sem os caminhos convencionais.

Naturalmente isso tem reflexos na igreja e na nossa fé. Talvez o fenômeno em si não seja novo. A sociedade já passou por transformações semelhantes. Mesmo a igreja já passou por isso. Em certo sentido, e guardada as devidas proporções, quando Martinho Lutero desencadeou a Reforma Protestante – que esse ano completa 500 anos –, ele abriu caminho para a leitura da Bíblia, a confissão de pecados, o recebimento da graça divina, de certo modo, sem a mediação da instituição religiosa que monopolizava o perdão.

Ironicamente, em alguns setores do cenário evangélico brasileiro, vivemos um processo de sacerdotatização da fé. Indivíduos são levados a crer que seu líder, pastor, bispo ou apóstolo são os que ‘dão cobertura espiritual’ para o crente e que o bem estar do crente depende do grau de espiritualidade de seu líder. Sem essa cobertura o crente fica sujeito a ataques do inimigo. Nos meios tradicionais essa sacerdotatização se expressa na institucionalização das práticas da fé de modo que qualquer experiência fora da prática daquela denominação ou comunidade é tida como herética. Qualquer experiência que não expresse a essência doutrinária da igreja deve ser repelida.

Isso tem levado a um abuso religioso comparável ao que a igreja medieval fazia com os fiéis. Dizer nesses casos que Jesus é o único mediador entre nós e o Pai soa heresia e rebeldia contra o ‘servo ungido’ do Senhor ou contra a doutrina e instituição eclesiástica. Nessas situações a uberização da fé é bem vinda. Precisamos relembrar e reafirmar os principais postulados da Reforma que rompe com a mediação da instituição religiosa e proclama a mediação única de Jesus Cristo, o único que pode oferecer expiação, que literalmente significa ‘cobertura’ espiritual para o crente.

É preciso fazer valer a essência do evangelho e do reino de Deus. O discípulo de Jesus vive em comunhão com Deus e com seu povo, porém, não de forma opressora e que o afaste de Deus e da comunidade. Precisamos de comunidades que exaltem a primazia de Cristo como nosso sumo sacerdote.


Pastor presbiteriano, doutor em Antigo Testamento e diretor acadêmico da Faculdade Teológica Sul-Americana, em Londrina (PR).

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