NOSSA MISSÃO: “Anunciar o Evangelho do Senhor Jesus à todos, transformando-os em soldados de Cristo, através de Sua Palavra.”

Versículo do Dia

Versículo do Dia Por Gospel+ - Biblia Online

terça-feira, 31 de outubro de 2017

A juventude dos reformadores: um chamado ao amor intergeracional

Uma das características marcantes da Reforma – mas pouco explorada – é a precocidade dos reformadores. Lutero tinha trinta e quatro anos quando afixou as 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Calvino tinha apenas vinte e sete quando chegou à Genebra e publicou a primeira edição da obra “Institutas da Religião Cristã”. Tyndale tinha trinta e cinco quando completou a tradução do Novo Testamento, em inglês. Cremos que esse lembrete vale uma reflexão bíblica muito útil para nossos dias.

As Escrituras elogiam aspectos da juventude, como a força, a energia, o entusiasmo. A mocidade é idade adequada para carregar pesos, realizar tarefas pesadas: “É bom que o homem suporte o jugo enquanto é jovem” (Lamentações 3.27). Juventude é tempo de empolgação, efervescência de ideias, sonhos de um mundo melhor. Contudo, a Bíblia alerta para os riscos próprios desse período, como excesso de confiança, ignorância, arrogância. Por isso, é necessário que os jovens sejam convertidos a Deus e obedientes à sua Palavra. “Como pode o jovem manter pura a sua conduta? Vivendo de acordo com a tua palavra” (Salmo 119.9).

Outro ponto de equilíbrio é a postura humilde perante os mais velhos, como o apóstolo Pedro alertou: “Da mesma forma, jovens, sujeitem-se aos mais velhos. Sejam todos humildes uns para com os outros, porque ‘Deus se opõe aos orgulhosos, mas concede graça aos humildes’” (1 Pedro 5.5). Se por um lado “a beleza dos jovens está na sua força; a glória dos idosos, nos seus cabelos brancos” (Provérbios 20.29). Esses cabelos brancos, na linguagem bíblica, não surgem de uma hora para outra: “o cabelo grisalho é uma coroa de esplendor, e se obtém mediante uma vida justa” (Provérbios 16.31).

Assim, a Bíblia mostra a importância da coexistência entre as gerações. Os mais velhos não têm força, mas têm experiência; os mais jovens não têm experiência, mas têm força. “Lembre-se do seu Criador nos dias da sua juventude, antes que venham os dias difíceis” (Eclesiastes 12.1) recomenda o velho pregador. A humildade, esperança e amor intergeracionais são marcas de igrejas genuinamente bíblicas. O fruto do Espírito é paz, amor, domínio próprio também entre as diferentes gerações: uma completa a outra, em amor, com respeito e lucidez.

Nesta época de mídias digitais, vemos jovens que se sentem autorizados a opinar, criticar, ironizar, palpitar acerca de assuntos nos quais não têm autoridade, nem competência. Paulo afirma expressamente que neófitos não podem liderar a igreja do Senhor: “Não se pode ser recém-convertido, para que não se ensoberbeça e caia na mesma condenação em que o caiu o Diabo” (1Timóteo 3.6). Por outro lado, há gente velha na igreja extremamente problemática, sem esperança, insegura em todos os sentidos concebíveis, que age como a serpente rastejando sobre o próprio ventre, oprimindo a próxima geração. Apenas o fato de ser “velho na fé” não é credencial, nem autorização alguma, para ações pecaminosas como a resistência às vozes jovens.

A igreja institucional na época da Reforma estava carregada de tradições humanas, de legalismos. Os pastores haviam se tornado impostores, feiticeiros ávidos em controlar as vidas das pessoas, suas possibilidades, seus recursos.

Neste aniversário de 500 anos da Reforma, lembremo-nos também da importância dos jovens na narrativa bíblica, na história da igreja, nas nossas comunidades locais. Como afirmou o pastor Rick Warren, “há crentes que envelhecem mas não amadurecem”. É necessário ter um testemunho cristão verdadeiro. Servos-líderes não podem ser neófitos, mas podem ser jovens, desde que maduros na fé: “Ninguém o despreze pelo fato de você ser jovem, mas seja um exemplo para os fiéis na palavra, no procedimento, no amor, na fé e na pureza” (1Timóteo 4.12).

Oramos por um Brasil mais justo, por mais amor nas famílias, por corações de filhos convertidos aos corações dos pais e corações dos pais convertidos aos corações dos filhos. Oramos por filhos próximos de suas mães, mães próximas de seus filhos. “Quando Jesus viu sua mãe ali, e, perto dela, o discípulo a quem ele amava, disse à sua mãe: ‘Aí está o seu filho’, e ao discípulo: ‘Aí está a sua mãe’. Daquela hora em diante, o discípulo a recebeu em sua família” (João 19.26-27). Aos pés da cruz as gerações estarão unidas, as famílias serão saradas. Todos nós, velhos e novos, adultos e crianças, precisamos crer Nele! Afinal, “até os jovens se cansam e ficam exaustos, e os moços tropeçam e caem; mas aqueles que esperam no SENHOR renovam as suas forças. Voam alto como águias; correm e não ficam exaustos, andam e não se cansam” (Isaías 40.30-31). É tempo de trazer à memória aquilo que traz esperança. Nossos dias são breves como o sono, são como a relva que brota e logo murcha e seca. Mas Deus é nosso castelo forte, nosso "refúgio, sempre, de geração em geração" (Salmo 90.1).


• Davi Lago, pastor batista, mestre em Filosofia do Direito (PUC/MG).

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

A arte corriqueira da Reforma

A arte é o reflexo do social. Essa frase é crucial para entender a escola artística dominante de cada tempo. A temática sempre representa aquilo a que se dá importância em cada época. Na arte renascentista, por exemplo, é comum vermos muitos corpos anatomizados, músculos e veias que saltam à pele e homens nus que tomam o conteúdo das narrativas bíblicas e mitológicas. Isso já era uma ideia recorrente na Grécia Antiga, mas no Renascimento o corpo toma uma ênfase bastante peculiar na exibição e tensionamento de músculos, refletindo o movimento do humanismo, a importância que o homem estava tomando na história.
A arquitetura greco-romana toma o cenário das telas. Mesmo que as cenas sejam passadas no Oriente Médio, são os arqueamentos romanos, pilares coríntios e as abóbodas que formam cenários, porque eram elementos considerados importantes para aquela cultura. Assim, segundos os próprios italianos, demonstravam a afirmação de uma cultura que renasceu depois da feroz estética medieval.
O que poderia ser o tema de uma pintura ou escultura em toda história da arte na Europa, desde a Grécia até o século 18? Existia uma hierarquia que transitava entre Maria, Jesus, santos mártires, divindades greco-romanas, membros da família Médici e da aristocracia. Em meio ao que era produzido em toda a Europa nesse período, a arte holandesa e de alguns países protestantes do norte da Europa do século 16 e 17 é impar.
Ao olharmos para a arte holandesa, o que vemos é algo muito diferente: pessoas comuns protagonizam as telas dos pintores, em seus afazeres mais corriqueiros. Uma mulher derramando leite na tigela; um casamento de camponeses (classe que antes não era tema de uma obra de arte); o cotidiano da rua, crianças brincando; naturezas mortas feitas com um primor nunca visto antes.
Como em toda cultura, aqueles artistas pintavam o que era importante para a sociedade. O que difere a Holanda dos demais países era que essas cenas corriqueiras, encenadas por pessoas comuns, tinham relevância. Na Holanda protestante não existia uma hierarquia de pessoas, tampouco um trabalho ou posição social que era mais ou menos importante. O pensamento influenciado pela Reforma Protestante era de que tudo é importante para Deus e de que todos tinham o mesmo valor. As coisas comuns, como a vida na cidade e os pormenores das ações humanas, também tinham valor.
Os holandeses começaram a enxergar tudo com um olhar permeado pela graça de Deus. Pintavam objetos ordinários colocados sobre uma mesa com a mesma maestria com que se esculpia um Davi na Renascença, porque entendiam que o dom deveria ser usado da melhor forma. Eles tinham o pensamento voltado para o fato de que tudo o que faziam era para Deus, portanto deveria ser feito da melhor forma.  Em pouco tempo superaram a Itália em técnica, produzindo pinturas que mal podem ser diferenciadas de uma fotografia digital.
Esses artistas tinham um olhar desprendido de parâmetros hierárquicos. Libertados pelo evangelho, olhavam para um mundo no qual tudo estava sob o cuidado de Deus, onde que cada detalhe da vida era importante. Viam na arte uma grande oportunidade de usar seus recursos, dando o melhor pra Deus. Assim, cumpriam cada tarefa com excelência. É isso o que a arte produzida neste período pode nos mostrar: a simplicidade do cotidiano, a beleza nas coisas mais simples, onde cada ação humana de um cristão tem valor, por mais trivial e habitual que nos possa parecer.
“Tudo o que fizerem, seja em palavra ou em ação, façam-no em nome do Senhor Jesus, dando por meio dele graças a Deus Pai” – Colossenses 3:17
  • Rafaela Senfft é artista plástica formada pela Escola Guignard/UEMG, onde é professora de História da Arte Ocidental no curso de extensão. É membro de CIVA (Christian in Visual Arts) e congrega na Caverna de Adulão, em BH.

domingo, 29 de outubro de 2017

A feira da vaidade

É curioso como o imaginário da criança dá uma reviravolta quando ela deixa de ser criança: já agora são outros olhos que, ao olharem as mesmas cenas de antes, enxergam mais aguçadamente nas entrelinhas da história. Em nossa cultura, as crianças costumam crescer embaladas por histórias dominadas por imagens fantasiosas de castelos e palácios, habitados por gente fina que anda em carruagens, cuja boa sorte é realçada pelo contraponto marcado pela presença de alguns aldeões ou mendigos à margem da estrada.

Diferentemente da poesia que na infância eu entrevia em tais imagens, senti-me revoltado quando a suntuosidade majestosa dos palácios de São Petersburgo foi mostrada outro dia num documentário da tevê, em estarrecedor contraste com a narrativa de como, no início do século 18, a opulenta ex-capital da Rússia Imperial foi plantada nos baixios de um terreno pantanoso, a custo do sacrifício de milhares de vidas. Foi como se uma nuvem espessa me impedisse de apreciar a beleza artística da arquitetura que desfilava diante de meus olhos.

Entre os povos da antiguidade não foi diferente: jardins suspensos e esfinges e pirâmides... Nos nossos dias megatorres opulentas vão sendo plantadas, onde quer que jorre petróleo e onde quer que o palácio do consumismo impulsione o capitalismo egoísta e desordenado, qual na “feira da vaidade” da alegoria de Bunyan em “O Peregrino”. Diante dessa “feira”, sinto-me como Paulo na capital da Grécia, “indignado de ver a que ponto esta cidade está cheia de ídolos” (At 17.16, versão ecumênica da S. B. Canadense).

Fico triste ao contemplar a visão materialista do mundo, que supervaloriza e até incentiva o supérfluo, que gasta fortunas astronômicas na ostentação do poder, enquanto povos inteiros passam fome e não têm onde morar, enquanto missionários que se sacrificam para pregar o evangelho de Jesus dependem, o mais das vezes, de um sustento incerto que não lhes permite viver condignamente.

Não é bom que isso aconteça. Não é bom que deixemos a mentalidade do mundo invadir a mente e os hábitos do povo de Deus. Não podemos gastar sequer cinquenta reais com o que não é essencial enquanto esse valor, pequenino para nós, representa tanto para os que deixaram tudo e foram viver entre pessoas carentes de Deus e dos recursos mínimos necessários para a sobrevivência. Seria uma contradição do evangelho que pregamos.

Antonio Carlos Wagner C. de Azeredo, 73, é secretário do Conselho Evangelístico de Missões da Igreja Presbiteriana Nacional, em Brasília, DF.

sábado, 28 de outubro de 2017

Por que eu sou incômodo?

Lembranças da infância trazem-me à memória, quase octogenária, alguns acontecimentos, via de regra, agradáveis; exemplificando, cantávamos um refrão que dizia: "um elefante incomoda muita gente, dois elefantes incomodam muito mais", brincadeira sadia que hoje é difícil encontrar igual neste mundo eletrônico.

Há lembranças maternas de recomendações com a higiene pessoal: tomar banho diário e não esquecer de lavar a cabeça, ou não deixar de esfregar atrás da orelha; ora, por que lavar a parte traseira, supostamente invisível aos olhos alheios?

Tenho lembranças de mães que não eram incômodas e, por isso mesmo, seus filhos, ainda na primeira infância, tinham os dentes cariados, pretos e furados – que desagradável!

Há algumas semanas, revista de grande circulação, datada de 04.10.2017, trouxe uma reportagem dizendo que "os evangélicos incomodam", traçou preconceituosamente o perfil dos evangélicos: pobres, de cor morena, etc. – não quero entrar no mérito do preconceito [inclusive sou descendente de afro-brasileiros].

Não faz muito tempo narrei aqui uma conversa de um grande amigo meu com o dono da empresa na qual trabalhei 44 anos; ele disse ao "ex-patrão" estou congregando na mesma igreja do Edmar, ao que foi indagado: "o Contador Geral?", o que o amigo confirmou: "sim, ele mesmo" – o chefe, então, disse: "exigente!" – meu comentário foi: "ele, o patrão, era considerado ‘exigente’ também"; se ele me chama de "exigente" e não, por exemplo, de "relapso", "irresponsável", "incompetente" isso me honra muito.

O que as pessoas não entendem, quanto aos evangélicos, é que eles são obedientes à Palavra de Deus, e o Senhor Jesus ordenou [a grande comissão]: "IDE por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura" (Mc. 16 15), e, ainda: "IDE, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado" (Mt. 28 19); e disse, antes de ascender ao Céu: "Mas recebereis poder, aos descer sobre vós o Espírito Santo, e SEREIS MINHAS TESTEMUNHAS tanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e ATÉ AOS CONFINS DA TERRA" (At. 1 8).

O Apóstolo Paulo, vou repetir o que tenho dito em outros textos, disse a Timóteo: "Conjuro-te, perante Deus e Cristo Jesus, que há de julgar vivos e mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: prega a palavra, insta, QUER SEJA OPORTUNO QUER NÃO, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo [é hoje] em que não suportarão a sã doutrina, pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas" (2 Tm. 4 1-4).

A nossa responsabilidade, como cristãos [seguidores do Senhor Jesus], é muito grande; disse-o o Apóstolo Pedro: "Vós, porém, sois raça eleita, SACERDÓCIO REAL, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, A FIM DE proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz" (I Pe. 2 9).

Disse, ainda, Pedro: "Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada [a 2ª. vinda do Senhor Jesus]; pelo contrário, ele é longânimo para convosco, NÃO QUERENDO QUE NENHUM PEREÇA, senão que todos cheguem ao arrependimento" (2 Pe. 3 9).

Na sequência ele diz que o Senhor Jesus virá "de surpresa" [como um ladrão de noite, que não avisa antecipadamente àqueles que vai roubar] e recomenda que sejamos encontrados em santo procedimento e piedade, esperando e apressando a vinda do Dia de Deus (v. 10-12).

O Senhor Jesus disse aos seus discípulos sobre a sua volta: "E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. ENTÃO, VIRÁ O FIM" (Mt. 24 14).

Pelo meu entendimento, temos que apressar a vinda do Dia de Deus levando a sua Palavra a toda criatura, a todas as nações até aos confins do mundo; só aí virá o Dia de Deus!

Quando pregamos, com insistência [incompreendida] a todos temos duas razões: alcançar, diretamente, aqueles que ainda não se converteram ao Senhor Jesus e, indiretamente, através dos nossos amigos já convertidos que, assim entendemos, vão "repassar" ou "compartilhar" com os de seu relacionamento.

O fato é que o evangelho tem que ser levado a todos, quer seja oportuno, quer não seja [texto acima citado], sem prejulgarmos:

- "este é salvo, não preciso falar com ele",

- "esse ainda não recebeu o Senhor Jesus, tenho que alcançá-lo diretamente ou via alguém já convertido."

Finalmente, quando o Senhor Jesus voltar, prefiro ser considerado por ele como "servo bom e fiel" [quiçá "exigente"] como ele disse na Parábola dos talentos, à qual me referi no texto anterior, em relação aos dois servos que ganharam novos talentos negociando com aqueles que o seu patrão lhes confiara, na sua ausência; e, um outro servo foi condenado por ter enterrado o talento, inclusive não recebendo o elogio "servo bom e fiel".

Pense nisto!


São Paulo - SP

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Discipular significa deixar que te sigam

Um dos maiores obstáculos para compreendermos o que é fazer discípulos é lermos essa expressão unicamente com as lentes da soteriologia, do estudo das doutrinas da salvação, sem atentarmos para o fato óbvio de que Jesus fez discípulos discipulando-os, não apenas salvando-os.

De modo geral, não paramos para pensar que os discípulos jamais precisariam especular – como fazemos hoje – sobre o que significou a ordem de “ide, fazei discípulos”, já que o discipulado era uma realidade presente em sua cultura e em sua própria experiência recente com Jesus.

Os discípulos nunca responderiam à Grande Comissão com “como faremos isso?”. Essa pergunta não está lá – nem poderia estar – porque os discípulos não tiveram dúvidas de como deveriam executar o que Jesus lhes estava pedindo. Eles foram discipulados!

Fazendo nossos próprios discípulos de Jesus

Se admitirmos que o Senhor Jesus ordenou que reproduzíssemos com outros o que ele fez com aqueles doze homens, então a Grande Comissão nos obriga a fazer discípulos não apenas dele, mas também de nós – à medida que somos discípulos dele. Por mais paradoxal que pareça, a missão que Cristo nos entregou é cumprida ao produzirmos os nossos próprios discípulos dele.

Quando Jesus se despediu de seus discípulos e os incumbiu de ensinar a novas pessoas, estava nomeando todos eles como discipuladores. Desde então e até os dias de hoje, Jesus não vai descer do céu para fazer novos discípulos. Agora isso compete a nós. Se fizermos discípulos apenas de Cristo e não de nós, então não estaremos discipulando, pois o sujeito ativo do “fazer discípulos” na Grande Comissão somos nós, e não ele.

Com tudo isso, não quero dizer que o objetivo final do discipulado é levar alguém a parecer-se conosco. Se for assim, teremos um alvo muito medíocre. A finalidade do discipulado é produzir um imitador de Cristo. Se o referencial sempre é Cristo e se nós o seguimos, o discípulo poderá seguir a nós.

Obter convertidos ou nutrir um relacionamento discipulador?

Mas por que será que recusamos tanto a ideia de termos nossos discípulos de Cristo? Uma parte da resposta é a rejeição a determinados movimentos de discipulado mais recentes que destoam do padrão bíblico. Mas, antes mesmo que tais movimentos surgissem, nós também não aceitávamos a ideia de que um discípulo genuíno de Cristo pudesse ter discípulos, ainda que por meio de um relacionamento saudável. Nós até admitimos que o discipulado pressupõe um discipulador de um lado e um discípulo de outro, mas chamamos esse discípulo de “discipulando”, “pupilo”, “mentoreado” ou até de “catecúmeno”, menos de discípulo.

Outra razão para essa recusa vem do fato de que, para muitos de nós, fazer discípulos tem sido pouco mais do que obter convertidos. Por esse pensamento, quando Jesus nos deu a Grande Comissão, sua intenção seria basicamente que buscássemos pessoas perdidas para a salvação. Com certeza, há algo de bíblico aqui. Mas a questão não é se nossa missão inclui semear o evangelho, mas se ela se resume a isso.

Bem, se nossa visão de fazer discípulos se limita a obter convertidos, então poderíamos fazer discípulos sem nenhum envolvimento relacional, e Jesus poderia ter feito discípulos sem ter convidado ninguém para segui-lo, pois seus sermões públicos bastariam.

Precisamos fazer discípulos de Jesus, sim, no sentido de levar pessoas ao arrependimento e à fé nele a fim de que sejam salvas. Mas também precisamos fazer discípulos de nós, o que significa desenvolver com essas pessoas um relacionamento de cuidado, ensino e aperfeiçoamento, para que elas também sejam levadas à multiplicação. Esse tipo de vínculo é o que chamamos de relacionamento discipulador, uma expressão formulada no contexto batista pela Junta de Missões Nacionais com a visão de Igreja Multiplicadora.

A essência do discipulado é seguir alguém

A Grande Comissão é algo que se implementa via relacionamentos. Ela acontece pela influência de um discípulo em outro, pessoa a pessoa, geração a geração, até chegar a todas as nações. Quanto à salvação, o discípulo é de Cristo, pois quem salva é ele. Quanto ao relacionamento discipulador, o discípulo é nosso, pois quem discipula somos nós.

Não se choque com os pronomes. Eles dão uma falsa ideia de posse. O sentido não é esse. Na verdade, entendo e respeito sua opção de não chamar os seus discípulos de seus, se for o caso. Você pode chamá-los de “discipulandos”, por exemplo. Contudo, certifique-se de que esteja desenvolvendo com eles o relacionamento discipulador modelado por Jesus.

• Diogo Carvalho
é pastor batista, gerente de evangelismo da Junta de Missões Nacionais, autor do livro Relacionamento Discipulador: uma teologia da vida discipular. Você pode conhecer a visão de Igreja Multiplicadora em www.igrejamultiplicadora.org.br

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

CAMPANHAS NAS IGREJAS E BÍBLICO?

Então perguntamos onde está o fundamento bíblico para se realizar campanha? Com toda certeza, no Evangelho de Cristo não há ordenança para as chamadas “campanhas” que os homens promovem hoje na maioria das igrejas. Nas escrituras não há uma só passagem que venha fundamentar o emprego da campanha na igreja.
Sinceramente não consigo olhar para as chamadas campanhas na igreja evangélica hoje sem questionar dois pilares que são fundamentais na realização de qualquer tarefa, alvo ou projeto que alguém possa estabelecer.

Os quais são: objetivo e resultado.

Perguntas estas que com certeza podem dar sentido a esta breve reflexão. Mas por favor, não pensem que sou algum tipo de Mister M querendo revelar os segredos dessa magia que superlotam os templos semanalmente. É que chega uma hora onde é necessário expor algumas vísceras para serem desinfetadas, e isto costuma fazer bem ao corpo. Por isso, tenho o prazer de convidar você para pensarmos juntos.

Você já se perguntou qual o objetivo de determinada liderança quando lança uma campanha nos moldes do tipo: sete passos para..., semana da vitória, semana do impossível, etc.? Pois eu já!

Certa feita eu perguntava a um pastor qual a necessidade em propor um serviço dessa natureza na igreja. Imediatamente ele me disse que era preciso trabalhar a fé do povo e que as campanhas são um excelente meio para isto, pensamento este que não parece ser diferente da maioria. O que de fato contraria o ensino de Rom.10:17 onde diz: “que fé vem pelo o ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus”, e não pelo o mérito de qualquer campanha.

Observem que as tais campanhas nunca terminam, pois quando uma chega ao fim do seu ciclo, outra já é anunciada no mesmo dia.

Não tenho dificuldades em dizer que as infinitas campanhas na verdade são instauradas para gerar um processo de fidelização de fiéis; ou seja, você estabelece sete semanas disso ou daquilo e terá como recompensa neste período sempre as mesmas pessoas fidelizadas em seus cultos, garantido assim bom número de expectadores e contribuições. Para instituições que visam fama e fins lucrativos a idéia é fenomenal, pois se trata de uma jogada de marketing violenta! Porém não atende a nenhuma das expectativas do Reino que, por sua vez, propõe relacionamento e governo de Deus em nós, propostas estas que as campanhas evitam mostrar.

Outro ponto a ser observado e que é lamentável, são os prêmios do ego oferecidos nas ditas campanhas semanais, os quais são: cura física, conquistas de casa própria, carros, promoção no emprego, pagamento de dívidas, entre outros; o que faz milhões de evangélicos marcharem incansavelmente semana após semana aos templos em busca dessas coisinhas; bem diferente do que Paulo ensina em colossenses 3:1-3 quando orienta a igreja a pensar e buscar o que vem de cima, onde Cristo está assentado.

Será que não é hora de analisar por que não existe campanha para se buscar o dom do amor? Campanha pela paz, que é um fruto do Reino? Ou porque não se faz a campanha pela justiça? Penso que os irmãos deveriam questionar e pensar um pouco mais a respeito destas coisas.

E quanto ao resultado das campanhas; desculpe-me quem discorda, mas não vejo saldo expressivo para o Reino. Primeiro porque as pessoas vivem em busca das “bênçãos” supracitadas; atividades estas que não habilitam ninguém ao Reino de Deus. Segundo que as tais campanhas criam pessoas peritas no que Deus faz, mas indoutas em quem Deus é; devido às distorções e pobreza da teologia apresentada. E o terceiro mal, é que se tem uma geração de viciados em campanhas, de maneira que, não é difícil ver a migração de fiéis para outras denominações por faltar campanha em sua igreja, ou por considerar a mesma desinteressante. E este comportamento tem feito muitos líderes repetir a mesma campanha do colega, gerando assim uma proposta única e lamentável de Igreja.

Enfim, penso que as campanhas são intermináveis porque intermináveis são os desejos deles por platéias e contribuições.

📚Autor: Gilaelson Santos

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Os verdadeiros reformadores

Semper reformanda tem sido deturpado. É um dos slogans mais abusados, mal utilizados e incompreendidos dos nossos dias. Os progressistas capturaram e mutilaram o lema do século XVII e têm exigido que nossa teologia, nossas igrejas e nossas confissões estejam sempre mudando para que se adaptem à nossa cultura em constante mudança. No entanto, semper reformanda não quer dizer o que eles pensam que significa.
Semper reformanda não significa “sempre mudando”, “sempre transformando”, ou mesmo “sempre reformando”. Antes, significa “sempre sendo reformado”. Quando foi usado pela primeira vez, semper reformanda era parte da declaração mais ampla ecclesia reformata, semper reformanda (a igreja reformada e sempre sendo reformada). Para tornar a declaração mais clara, a expressão secundum verbum Dei (segundo a Palavra de Deus) foi acrescentada mais tarde, compondo a declaração “A igreja reformada e sempre sendo reformada segundo a Palavra de Deus”. Ela surgiu de uma preocupação pastoral de que nós, como povo de Deus, sempre fôssemos reformados pela Palavra de Deus, de que a nossa teologia não fosse meramente conhecimento teórico, mas que a nossa teologia fosse conhecida, amada e praticada em toda a vida. Em palavras simples, que a nossa teologia reformada de acordo com a Palavra de Deus estivesse sempre reformando as nossas vidas.
De modo fundamental, a teologia reformada é a teologia fundamentada e formada pela Palavra de Deus. Pois é a Palavra de Deus que forma a nossa teologia, e somos nós que somos reformados por essa teologia enquanto voltamos constantemente à Palavra de Deus todos os dias e em cada geração. Na sua essência, é isso que a Reforma do século dezesseis foi, e é isso que ser Reformado significa: confessar e praticar o que a Palavra de Deus ensina. A Palavra de Deus e o Espírito de Deus reformam a igreja. Dito isso, meros homens não são os verdadeiros reformadores, mas antes são mordomos e servos da reforma de Deus.
Nesse sentido, Martinho Lutero, João Calvino e outros não foram reformadores. Lutero e Calvino não se manifestaram ousadamente para reformar a igreja; humildemente, eles se submeteram à verdade reformadora da Palavra e ao poder reformador do Espírito. A Palavra e o Espírito reformaram a igreja no século dezesseis, e desde então eles têm reformado a igreja. Lutero e Calvino foram os que ajudaram a apontar a igreja de volta para a Escritura, e para a Escritura somente, como a autoridade infalível para a fé e a vida.
A Reforma não terminou, nem jamais terminará, porque a reforma — a Palavra de Deus e o Espírito de Deus reformando a sua igreja — nunca terá fim. A Palavra de Deus é sempre poderosa e o Espírito de Deus está sempre trabalhando para renovar as nossas mentes, transformar os nossos corações e mudar as nossas vidas. Portanto, o povo de Deus, a igreja, sempre estará “sendo reformado” segundo a Palavra imutável de Deus, não de acordo com a nossa cultura em constante mudança.

*Burk Parsons é pastor na Saint Andrew’s Chapel, em Sanford (Flórida), e editor da revista mensal Tabletalk, publicada por Ligonier Ministries.


terça-feira, 24 de outubro de 2017

A missiologia cristã sob o movimento Reformado

A Missiologia é uma área de estudo da Teologia relativamente recente, com origem na primeira metade do século XX. Surgiu como demanda teológica das discussões sobre estratégias da evangelização, realizadas pela Conferência de Evangelização em Edimburgo (1910). O intenso esforço missionário protestante dos séculos XIX e XX (chamado de “O Grande Século das Missões”), os problemas culturais e sociopolíticos (apontados pelo antigo Terceiro Mundo em relação ao missionarismo moderno), as guerras e a condição humana no Ocidente, etc. foram situações que pediram reflexão teológica das missões em geral, envolvidas diretamente com as questões dos novos contextos. A Missiologia aparece como um dos resultados da Teologia no esforço de corresponder a tais problemas.

Das estratégias de evangelização às discussões da primeira metade do séc. XX, houve uma convergência para a busca de entendimento da natureza missionária da Igreja , as implicações sociais da evangelização e sua contextualização. Áreas do conhecimento científico, como a Sociologia, Antropologia Cultural, Linguística e outras, serviram de instrumentais teóricos e metodológicos para o estudo da Missiologia. A América Latina, por ter sido por muito tempo campo do missionarismo protestante moderno, desde meados do século passado, tem realizado esforços próprios de pensar a missão da Igreja a partir de seu próprio contexto, gerando no seio evangélico mais do que uma missiologia, e, sim, uma Teologia de natureza missionária, com ênfase na contextualização de seu conteúdo e método, o que chamamos de teologia evangélica latino-americana.

A Reforma Protestante como Prática Missional Integral e Libertadora


A Reforma Protestante do séc. XVI foi acusada de não envolver a evangelização dos povos não cristãos, principalmente aqueles do chamado “Novo Mundo”, para onde foram os Jesuítas e outras ordens monásticas levar o cristianismo católico. Isto, de fato, ocorreu, e, entre justificativas teológicas, principalmente aquelas orientadas pelas ideias da eleição e da predestinação, estavam a necessidade de concentração de esforços para o estabelecimento do movimento de Reforma na Europa. Outra razão foi a não superação da ideia de cristandade pelo movimento protestante inicial e a manutenção da relação entre Igreja e Estado, tão criticada pelos anabatistas, que levou a estabelecer inicialmente o protestantismo somente em lugares em que os governantes se tornavam protestantes.

Se considerarmos a evangelização em seu sentido restrito, de proclamação oral do evangelho visando a conversão de pessoas para o cristianismo, certamente concluiremos que a Reforma Protestante teve pouco envolvimento evangelizador. Mas, sob o ponto de vista de uma nova evangelização, em seu sentido lato, abrangente, de transformação da vida e da realidade sócio-histórica, a partir do encontro com a graça de Jesus Cristo por meio das Escrituras, verificaremos que o movimento protestante, desde suas origens, mostrou-se caracteristicamente missional. Foi justamente no espírito de missão que a Reforma Protestante se deu. Por outro lado, fica o entendimento de que ações realmente missionárias provocam profundas transformações, verdadeiras reformas, em todo o contexto em que elas são realizadas.

A Europa da época dos reformadores era organizada na forma de cristandade, o que não significa que todas as pessoas eram de fato cristãs. A Reforma não somente contribuiu para colocar a Bíblia nas mãos do povo, mas estimulou seu livre estudo, ensinando que o Espírito Santo ilumina a todos para essa tarefa, indistintamente. O culto foi descentralizado e ganhou novos significados, com ênfase nas Escrituras, no ensino e na pregação. A salvação pela graça em Jesus Cristo foi a descoberta mais libertadora dos reformadores. Foi a verdade das verdades no movimento protestante, suficiente para desmantelar o clericalismo que prevaleceu na Igreja medieval. A corrupção teve no sistema de indulgências um terreno fértil para se propagar; por meio da dominação política e social da Igreja que se autocompreendia como detentora do poder de salvação.

A salvação pela graça de Jesus Cristo foi a verdade mais missional e libertadora, aplicada pela Reforma Protestante àquela situação religiosa e sociopolítica da Europa medieval. A libertação, sob tais bases teológicas, não se ateve somente às questões religiosas, mas foi também política e social, a ponto de ser considerada uma das forças da mudança cultural que ocorreu na Europa e originadora da modernidade.

Conclusão


A Missiologia, contemporânea, possui como uma de suas tarefas mais urgentes, recuperar a importância da Reforma Protestante, a partir dos novos contextos sócio-históricos e culturais latino-americanos, visando a sua necessidade de transformação. É preciso, entretanto, não somente de um círculo de interpretação adotado pela Missiologia latino-americana, mas da condição de Ecclesia Reformata et Semper Reformanda est, lema e propósito originário da Reforma, de suspeitar e não reproduzir os aspectos antitestemunhais do evangelho do Reino que se deram no incurso do movimento de Reforma e no posterior desenvolvimento do protestantismo. No entanto, como orientação missional, o caráter amplamente libertador da Reforma, a tornou fundante, não somente do protestantismo enquanto vertente cristã, mas da própria missão protestante que, em função de tais bases históricas e teológicas já apontadas, exige ser libertadora e integral, não menos do que isto.

• Regina Fernandes Sanches é mestre em teologia e práxis, especialista em história e cultura Afro-brasileira e atuante na educação teológica desde 1995.

Nota:
Texto escrito a partir da participação da autora em “Diálogos na Web 500 Anos Reforma Protestante”, uma iniciativa da Aliança Evangélica. Publicado originalmente pela Aliança Evangélica e também graças à parceria entre Aliança Evangélica, Ultimato e Basileia.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

04 motivos porque o conhecimento teológico é fundamental ao jovem na universidade

Quando um filho entra numa universidade somos tomados por um misto de sentimentos. Se por um lado vibramos por ver aquele que amamos entrando no mundo acadêmico, por outro nos preocupamos, visto que muitos conceitos e valores comportamentais disseminados nas universidades opõem-se aos valores bíblicos cristãos. 
Outro dia eu escrevi algumas razões porque os jovens evangélicos estão se desviando na universidade (aqui). Hoje, visando ajudar pais e professores e pastores na educação e qualificação  de seus adolescentes e jovens, elenco quatro motivos porque o conhecimento teológico é fundamental ao jovem universitário, senão vejamos:
1-) O conhecimento teológico é fundamental ao universitário pelo fato de ajudá-lo a combater de forma efetiva a ideia secularista e ateísta da inexistência de Deus.
2-) O conhecimento teológico é fundamental ao universitário pelo fato de de ajuda-lo a combater de forma racional e lógica a ideia Darwinista da evolução.
3-) O conhecimento teológico é fundamental ao universitário pelo fato de poder ajudá-lo a contrapor-se aos conceitos gramscistas defendidos por professores cujo doutrinamento esteja fundamentado no marxismo cultural.
4-)  O conhecimento teológico é fundamental ao universitário pelo fato de poder ajudá-lo diante do relativismo inerente a pós-modernidade, capacitando-o à luz das Escrituras a contrapor-se aos valores de um mundo absorto em maldade.
Isto posto, penso que tanto a igreja como pais precisam fazer pelo menos quatro coisas:
1-) Elaborar grupos de estudo bíblico onde de forma efetiva possam discutir as doutrinas fundamentais à fé cristã.
2-) Reformular a chamada Escola Bíblica dominical, oferecendo aos alunos uma classe específica em que possa oferecer aos alunos ferramentas que se contraponham aos ideais marxistas e gramscistas.
3-) Criar um módulo de ensino onde a "cosmovisão protestante deva ser ensinada tratando portanto de assuntos nevrálgicos ao nosso tempo.
4-) Promover espaços para aconselhamento bíblico e cristão ajudando o jovem a relacionar-se com a cultura sem contudo ser dominado por ela.
Pense nisso!
Renato Vargens

domingo, 22 de outubro de 2017

Morrer e viver para Cristo

Uma das maiores belezas do cristianismo é a correspondência entre o senhorio absoluto de Cristo sobre a criação (conforme disse Abraham Kuyper, “não há um centímetro sobre o qual Jesus não proclame: é meu”) e  a adoração total que Deus requer de nós – “amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento” (Lucas 10.27). Ou seja, assim como Deus é íntegro e está profundamente comprometido conosco até, literalmente, a morte (Filipenses 2.8), ele quer que nossa resposta a ele também se aproxime cada vez mais dessa integridade. Essa integridade não é periférica, não é mero detalhe que agrada a Deus e pronto, mas é sobretudo onde residirá nossa saúde mental e emocional, em oposição ao pecado que fragmenta a vida e a identidade.
Ainda que muitas vezes nem pensemos nisso, conhecemos bem o efeito fragmentador do pecado. Nossa mente está firme em um propósito específico, mas, quando chega a hora, fazemos exatamente o oposto (Romanos 7.19). Desejamos a paz, mas nutrimos todo tipo de sentimentos horríveis contra pessoas que amamos (Tiago 3.14-16). Dizemos que seguimos a Cristo, mas na prática nos contentamos com padrões muito baixos (1Coríntios 10.10). Além disso, todo o sistema de pensamento apóstata, como dizia Cornelius Van Til, está calcado na fragmentação. É como se o homem exteriorizasse sua fragmentação interior – bem plantada na rebeldia contra Deus desde o Éden – construindo todo um mundo de falsas oposições. E muitas dessas falsas oposições fazem parte de nós sem serem confrontadas.
Uma delas persiste há pelo menos cinquenta anos e diz respeito diretamente à identidade da esposa. É a ideia de que a mulher dedicada à família perderá toda a sua relevância pública. Deixará de contribuir significativamente para o mundo, emburrecerá, será alienada, passiva, escrava da necessidade dos outros. O feminismo se levanta com ira contra essa imagem estereotipada, construindo outra não menos estereotipada da mulher que se “empodera” desprezando o cultivo da intimidade conjugal, a maternidade e a vida interior. Em reação, algumas igrejas aderem a uma idealização da mulher no lar, vetando ou desencorajando o desenvolvimento de suas potencialidades no mundo lá fora. Nos dois casos, a vida no lar é vista como inimiga de qualquer atividade exterior.
A Bíblia nos apresenta um panorama muito melhor, que anula as falsas oposições como essa. Atividades exteriores não são proibidas, mas há prioridades – que, aliás, valem tanto para a mulher quanto para o homem. Se, de acordo com Paulo (1Timóteo 3.1-5), o candidato a líder da igreja deve liderar bem sua própria casa, isso significa que a casa vem primeiro. Além disso, pede-se que o homem se sacrifique não pela carreira nem pela igreja, mas pela esposa (Efésios 5.25). Acima da família, a primazia é de Deus: não como conceito tranquilizador, não como símbolo de valores conservadores, não como fonte de bênçãos materiais; mas como o Senhor de tudo o que existe, inclusive da identidade pessoal. Não há como fazer qualquer coisa no mundo, nem cuidar da família, nem trabalhar fora, nem ajudar a igreja, sem os passos interiores do reconhecimento de pecados, do arrependimento sincero, do perdão, da santificação e da adoração ao Deus verdadeiro.
Debaixo desse único Senhor, nutridos por seus ensinamentos e sua constante graça, a vida e o eu se unificam. As falsas oposições se desmancham. Cuidar da casa em um sentido prático (comida, limpeza, arrumação) passa a acompanhar o cuidado em um sentido mais profundo (o aprendizado do relacionamento, dos dons, dos limites – em suma, do amor). Pensar o mundo em casa, no trabalho e na igreja se afinam: a vida intelectual se torna uma só, subjugada à Palavra (2Coríntios 10.4-5), não mais disputada por falsos mestres. As conversas entre família ajudam a viver melhor, pois a sabedoria de Deus está presente no coração, nas palavras e nas ações. O cuidado é máximo para que nenhuma outra palavra humana tome a dianteira da Palavra de Deus (Romanos 3.5).
Há muitos irmãos a levar uma vida dividida. Imaginemos uma mulher cristã que é professora universitária de sociologia. Ali, ela mergulha nas águas de uma cosmovisão naturalista e cientificista, sem conseguir confrontar diretamente a ideia de que os homens são produto do meio e não há valores eternos e imutáveis. Sempre que ela dá aulas, essa ideia passa aos alunos como veneno de gosto agradável. No domingo, ela troca de “canal”, ouve de bom grado a pregação e acata viver de acordo com pressupostos bíblicos.
Qual a solução para reencontrar sua integridade? Abandonar o emprego? Não necessariamente! Talvez ela chegue a essa conclusão em determinadas fases da vida: o marido já sinalizou que prefere sustentar a casa sozinho; os filhos estão pequenos e precisam dela; ela prefere fazer um trabalho voluntário não remunerado na igreja. Se ela conseguir manter a prioridade do lar – e sim, muitas vezes essa prioridade demandará mais tempo em casa – , o emprego não será empecilho. O problema central é interior: essa pessoa pode até ser uma cristã sincera, mas está vivendo uma vida dupla. Enquanto ela não confrontar com a Palavra a ideia de que o homem é produto do meio, essa ideia vai “dar uma rasteira” em seu desejo de servir a Deus, evitando que ela se responsabilize plenamente por sua vida. Ela se verá como um joguete de forças maiores que, em seu coração, competem contra Deus e a farão tropeçar no momento em que ela mais precisará agir em conformidade com a fé. Ela deverá apresentar seu corpo como sacrifício vivo a Deus, todos os dias, para ter a mente transformada em direção ao reconhecimento da vontade divina como boa, agradável e perfeita (Romanos 12.1-2). Mesmo se isso significar perder simpatias, arruinar sua reputação no meio universitário e arriscar toda a carreira – o que, para ela, parecerá morrer.
Mas não é exatamente isso que a Palavra diz (Romanos 6.10-14)? Morramos sem medo, pois estaremos vivas – vívidas, inteiras – para Cristo!

Fonte: Voltemos ao Evangelho

*  Norma Braga Venâncio é doutora em Literatura Francesa pela UFRJ e mestranda em Teologia Filosófica pelo Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (Universidade Mackenzie). Publicou A mente de Cristo: conversão e cosmovisão cristã pela editora Vida Nova. É casada com André Venâncio e mora em Natal, RN.

sábado, 21 de outubro de 2017

“O perigo de lidar com uma mente manipuladora”

E esta mente pode ser a nossa ou do outro.

A ausência da admiração honesta e sincera nos faz vaguear em dois extremos distintos:

Primeiro somos apaixonados e se não correspondido nossa paixão doentia, esta é transformada em um profundo sentimento de ódio.

Nas relações que construímos ao longo da nossa trajetória poderemos em uma determinada estação viver uma experiencia semelhante à do José, aquele que fora vendido por seus irmãos para o Egito.

Quem olhassem de fora diria: O Garoto teve uma boa sorte, poucos dias a disposição no mercado de escravos, fora vendido para uma pessoa do alto escalão do Governo, o poderoso Potifar.
E lá foi ele para mais uma aventura que se transformaria em um poderoso treinamento.
Depois de algum período o seu testemunho foi tão marcante que seu patrão depositou total confiança na administração de todos os bens.

No livro do Richard Foster, ele elucida o tripé que sempre está no encalço das pessoas, principalmente na gestão masculina. Ele afirma que o Dinheiro, Sexo e Poder, são conexões de poder que pode confirmar uma liderança ou que pode colocá-la em total exposição.
Basta olharmos para o cenário nacional e perceber a exposição do Poder e do Dinheiro, retrato de uma sociedade com bastante dificuldade em lidar com esta área, isto sem mencionar a questão do ícone Sexo.
E justamente neste quesito que foi o teste liberado para o ainda jovem José. Distante da família, dos olhos do Pai, dos amigos, da vizinhança ou de outros clãs, teria toda condição de ceder ao encanto de uma bela mulher.
Se tivesse outra cabeça ele diria: isto era só que me faltava para me tornar o ex-escravos mais bem-sucedido deste velho Egito.
Garantir que Jose leu o livro de Josué 1.8, seria uma odisseia literária pois este texto ainda não havia sido escrito por Moises, que nasceu bem depois deste evento, mas é possível declarar que em algum momento, na mente de José havia sido impregnado os princípios bíblicos contados por seu Pai, por seu avó acerca da promessa feita ao seu Bisavó Abraão.
E olha que não faltaria história, uma delas foi o Eliezer que buscou sua avó Rebeca andando cerca de 1800 quilômetros e não abriu mão do princípio da honra, do respeito, e da preservação da integridade da linda moça na época.
Agora Jose teria que tomar uma decisão ao ser pressionado por uma mente manipuladora.
Pessoas que possuem tal personalidade não desistem fácil, são teimosas, são extremamente persistentes e é provável que algum momento agimos assim ou somos tal pessoa.
A mulher do seu patrão ficou louca por ele, uma paixão doentia que teria que possuí-lo a qualquer preço.
Tentou de todas as formas e encontrou total resistência.
Quando uma pessoa com esta personalidade é ignorada ou seus desejos não são atendidos, aquilo que era uma paixão doentia se torna em ódio mortal.
Basta lermos o texto em Genesis 39.6 ao 20, com atenção e veremos que a esposa de Potifar, não se deram o luxo nem de citar seu nome, se transformou em pior inimiga de José e o enviou para o cárcere injustamente.

Provável que tenhamos muitos encarcerados que foram enviados em situação semelhante e dependem de uma intervenção divina.

Concluímos que o jovem José conseguiu passar pelos três níveis de testes sendo eles no Poder, no Dinheiro e no Assédio Sexual, de forma louvável, certo que sua garantia, força, virtude, não estava sustentada por conceitos humanos, psicológicos ou filosóficos, mas através dos princípios presentes na essência do Deus criador e que deseja ardentemente que sua criatura, o homem, usufrua destes a fim de ter uma vida em equilíbrio emocional, física e espiritual.
E nós, será que passaríamos nos testes?

O problema quando manifestamos este ato emocional manipulador com as pessoas vamos com certeza replicar na nossa relação com Cristo, na mesma proposta, e, não por não sermos atendidos, pois Cristo jamais atenderá uma solicitação de um manipulador, desejaremos mandar Cristo para uma prisão, ou mesmo de volta para Cruz. Nós simplesmente viramos as costas e dizemos: Com Cristo eu não me relaciono mais, e como o representante de Cristo no mundo é a igreja, esta é a primeira que sentirá nossa ausência, e ainda pensarmos: Ela sentira a minha falta e as consequências de não ter atendido as minhas expectativas.
O bom de tudo isto que existe um remédio para nos curar de tal condição comportamental.

Quero deixar uma fala escrita no livro de Josué 1.8 onde demonstra qual é o verdadeiro sucesso para um homem ou uma mulher

O comportamento da obediência sobrepõe o terrível comportamento
manipulador.

"Não se aparte da tua boca o livro desta lei; antes medita nele dia e noite, para que tenhas cuidado de fazer conforme a tudo quanto nele está escrito; porque então farás prosperar o teu caminho, e serás bem sucedido." Josué 1:8


Guarulhos - SP

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Os cinco solas e o legado da Reforma Protestante

Lutero, o grande reformador, foi feliz ao ler Romanos 1:16 e 17 e perceber que a salvação é pela fé, e que o “justo vive pela fé”. Em 31 de outubro comemora-se 500 anos de quando Lutero, indignado com a venda de indulgências e com a falta de compreensão e de ensinamento bíblico, enviou as 95 teses a seus líderes na Igreja Católica. Lutero combateu as indulgências falando da graça e da salvação pela fé: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9).
A Reforma tem cinco pilares, os cinco “solas” (somente): Sola Scriptura (Somente a Bíblia e toda a Bíblia); Solus Christus (Somente Cristo); Sola Gratia (Somente a Graça); Sola Fide (Somente a Fé); Soli Deo Gloria (Somente a Deus Glória). E o lema da Reforma éEcclesia Reformata et Semper Reformanda Est”, ou seja, “Igreja reformada, sempre se reformando”. O legado da Reforma é que devemos crer e ensinar esses cinco pilares, que são fundamentais para a saudade da igreja e da fé cristã.
O povo de Deus deve pregar e ensinar que a Bíblia é a Palavra de Deus, e que somente ela é a regra de fé e prática da vida do cristão, e que todo cristão deve vive e ser orientado pela meditação e leitura das Sagradas Escrituras.
O povo de Deus deve adorar somente a Jesus, o Cabeça da Igreja, o Salvador e Senhor de nossas vidas, e assim toda honra, glória e louvor devem ser dados a Jesus, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Essa adoração exclusiva a Jesus Cristo expulsa o misticismo, o sincretismo, a compra de indulgências e a idolatria. Para os reformados só há adoração a Jesus Cristo, Senhor e Salvador de nossas almas.
O povo de Deus deve ser alimentado pela graça de Deus. Somos chamados ao Seu Reino através da graça, o favor imerecido que nos oferece a salvação por meio da fé, que nos comunica que Deus fez tudo em nosso lugar, e que Ele nos ama com amor eterno. A Reforma nos deixou esse legado: somos salvos pela graça e não por obras ou por “qualidades” pessoais.
A Reforma reafirma a certeza e segurança de que somos salvos pela fé, e que vivemos pela fé confiados na graça de Deus e no sacrifício de Jesus. Esse sacrifício pagou por nossos pecados, nos absolveu da condenação eterna e da ira do Senhor, e nos redimiu por completo. Por isso, o povo de Deus vive pela fé e não pelas coisas que se veem.
A glória por tudo isso pertence somente a Deus, pois o Senhor não divide Sua glória com ninguém. A Reforma lembrou os cristãos que fomos criados para a glória de Deus e que devemos viver para a glória de Deus.
O movimento da Reforma tirou a Igreja do desvio de rota em que estava e a trouxe de volta para o caminho. No decorrer dos séculos, a Igreja precisa continuar deixando a Reforma acontecer, para que as práticas que não estão dentro dos padrões bíblicos sejam reformadas e que o povo de Deus se volte para a Palavra. Esse movimento nos convida a analisarmos a caminhada da Igreja de Jesus a partir dos referenciais dos cinco solas continuamente.
É tempo de celebrar os 500 anos da Reforma Protestante, louvar a Deus pelo cuidado com a Igreja, e orar para que continuemos sempre em reforma, para cumprir a missão do Senhor com fidelidade.
  • Jeferson Rodolfo Cristianini é pastor da PIB Bauru.

domingo, 15 de outubro de 2017

SOLA GRATIA

Um dos pilares da Reforma Protestante do Século XVI foi o Sola Gratia. A salvação é uma obra de Deus do começo ao fim. Deus planejou, executou e consumou nossa salvação. Aquilo que foi planejado na eternidade e realizado na história será consumado na segunda vinda de Cristo. O apóstolo Paulo diz que somos salvos pela graça, mediante a fé (Ef 2.8). Deus nos tirou das entranhas da morte espiritual, nos ressuscitou juntamente com Cristo e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus; para mostrar, nos séculos vindouros, a suprema riqueza da sua graça. Destacaremos quatro pontos importantes sobre essa maiúscula verdade:
Em primeiro lugar, Deus nos salvou não por causa dos nossos méritos, mas apesar dos nossos deméritos. A salvação não é uma conquista das obras, mas uma oferta da graça. Não somos salvos pela obra que realizamos para Deus, mas pela obra que Deus realizou para nós, na pessoa do seu Filho. A salvação não é uma medalha de honra ao mérito, mas um presente imerecido de Deus. Em vez de Deus aplicar em nós o seu justo juízo, aplicou-o em seu Filho, como nosso substituto, concedendo-nos gratuitamente sua bondade.
Em segundo lugar, Deus nos salvou não pelo nosso esforço, mas pelo sacrifício de seu Filho. A salvação não é resultado de esforço humano, mas da ação divina. Não é fruto do trabalho humano, mas do sacrifício de Jesus na cruz. Não é consequência das obras que realizamos, mas da generosa oferta da graça. A salvação não é um caminho que abrimos da terra ao céu, mas o caminho que Deus abriu do céu à terra. Esse caminho é Jesus. Só ele pode nos reconciliar com Deus. Só por meio dele, podemos ter vida eterna. Não há nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos, exceto o nome de Jesus.
Em terceiro lugar, Deus nos salvou não pelos nossos predicados morais, mas por sua imerecida graça. Graça é um dom imerecido. Deus dá a salvação a pecadores indignos. Deus nos amou quando éramos fracos, ímpios, pecadores e inimigos. Estávamos perdidos e fomos achados; estávamos mortos e recebemos vida. Isso é graça. Deus nos tirou da potestade de Satanás, arrancou-nos da casa do valente e transportou-nos do reino das trevas para o reino da luz. Isso é graça. Estávamos no caminho largo que conduz à perdição, éramos escravos do mundo, da carne e do diabo, mas Deus nos libertou e nos transformou e nos fez assentar nas regiões celestes. Isso é graça. Graça é o que Deus nos dá e precisamos, mas não merecemos.
Em quarto lugar, Deus nos salvou não para que exaltássemos a nós mesmos, mas para que fôssemos troféus de sua graça. A salvação procede Deus, é realizada e consumada por Deus para que ele receba toda a glória. O propósito da salvação pela graça é exaltar a Deus e não o homem. Ninguém poderá chegar no céu, bater no peito e dizer que chegou ali por seus méritos e esforços. Ninguém pode atribuir a si mesmo ou mesmo à sua religião a sua salvação. Todos os que são salvos, o são pela graça, e pela graça somente. Nenhum mérito humano. Nenhuma glória atribuída ao homem. Nenhum holofote sobre o homem. Tudo provém de Deus. Dele, por meio dele e para ele são todas as coisas. Qualquer glória atribuída ao homem é vanglória, é glória vazia, é idolatria, é abominação para Deus. O próprio Deus diz em sua palavra que não divide sua glória com ninguém. Por toda a eternidade renderemos glória àquele que nos amou, e nos enviou seu Filho, para que, por meio dele, fôssemos salvos. Hoje somos filhos de Deus, herdeiros de Deus, a menina dos olhos de Deus, troféus da graça de Deus!

Rev. Hernandes Dias Lopes

sábado, 14 de outubro de 2017

A Palavra de Deus e a crise de integridade

“Onde a Palavra não é pregada e aceita o povo se corrompe”. Essas palavras parafraseadas de Provérbios 29.18 – lit.: “onde não há visão/profeta o povo se desvia” - refletem muito bem o entendimento dos antigos sábios do quanto à falta da instrução de Deus afeta a qualidade moral de um povo. A sabedoria de Provérbios e de outros escritos do Antigo Testamento é enfática na necessidade de se meditar na lei do Senhor para que se viva bem na terra. Contudo, o temor de Deus e a meditação na lei do Senhor afetavam não só a qualidade moral do povo como também a qualidade de vida, do governo e da sociedade. Por meio dos sábios, dos profetas e dos sacerdotes a lei do Senhor era ensinada e praticada.

Há duas boas razões para refletirmos sobre essa passagem no momento atual. Primeiro, neste mês lembramos a Reforma Protestante do século 16. Como sabemos, a Reforma desencadeou um movimento que resgatou e sustentou dentre muitas verdades a primazia da autoridade e, consequentemente, da exposição das Escrituras na igreja. Os primeiros reformadores (Calvino, Bullinger) entendiam que a verdadeira igreja era marcada pela pregação da Palavra e fiel administração dos sacramentos. Posteriormente, outros (Pedro Mártir, Zacarias Ursinus) acrescentaram ainda como terceira marca da verdadeira igreja a disciplina. Theodoro de Beza, por outro lado, falava de uma única marca da igreja, a pregação. De todo modo, para o teólogo Robert Godfrey, cada uma dessas três marcas é a expressão da principal marca, a Palavra. E a Palavra é entendida pelos reformados como: a) a Palavra eterna, isto é, a segunda pessoa da Trindade; b) a Palavra encarnada, Jesus Cristo; c) a Palavra escrita, a Bíblia; e d) a Palavra proclamada.1 Por isso, quando falamos da Palavra como principal marca da igreja, estamos falando da presença do próprio Deus na igreja. É a Palavra pregada e vivida que manifesta os propósitos, juízos, misericórdia e salvação de Deus. Assim, à medida que a igreja prega a Palavra e o povo de Deus pratica a justiça e o amor, Deus se manifesta e a igreja é um testemunho e sinal do reino de Deus na terra.

A segunda boa razão de meditarmos nessa passagem se deve ao momento político e social de nossa nação. Por mais que a corrupção não tenha surgido agora, estamos sendo constantemente expostos e lembrados da corrupção generalizada. Isso nos faz pensar que vivemos no país uma profunda crise de caráter e integridade. Isso não se limita aos empresários e políticos envolvidos nos casos que estão sendo investigados, mas à nação como um todo. Há uma crise de caráter porque perdemos o referencial do certo e errado. Mesmo que boa parte da população não professe ou não pratique a fé cristã, a sociedade está fundada em valores e princípios de justiça e igualdade os quais se sustentam por deveres e direitos dos cidadãos. E como cristãos entendemos que há também princípios bíblicos que dirigem nossa vida -- não só religiosa e espiritual como também nossa vida na sociedade.

Mas você dirá: a igreja está ativa na sociedade. Ela evangeliza e prega a palavra por todos os meios possíveis de comunicação. As religiões crescem, literatura religiosa e bíblica está cada vez mais acessível às pessoas. A Bíblia pode ser encontrada nas livrarias dos shoppings, bancas de jornal ou de camelôs. Não há falta de proclamação da Palavra. Mesmo assim, “o povo se corrompe”.

Curiosamente, foi justamente no período de importantes profetas do Antigo Testamento, como Elias, Eliseu, Amós, Oseias Isaías, Miqueias, Jeremias, Ezequiel e outros que as maiores abominações eram praticadas em Judá e Israel. Nem mesmo a reforma do rei Josias em Jerusalém, quando o livro da lei foi descoberto no templo e passou a ser ensinado e praticado, foi suficiente para impedir a catástrofe do exílio babilônico (2 Rs 23.24-27). Então, até que ponto a proclamação da Palavra impede um povo de se corromper ou se desviar?

Primeiro, à medida que o povo de Deus pratica os ensinamentos de Jesus, a igreja não só serve de sinal da presença e do reino de Deus como também influencia a sociedade por meio de suas ações. Se de um lado é verdade que importantes profetas do Antigo Testamento viveram em época de muita idolatria e abuso de poder dos reis, também é verdade que sua pregação confrontou e incomodou os reis. Além disso, a história da igreja é repleta de exemplos em que o compromisso da igreja com o ensino das Escrituras teve impacto positivo na sociedade. Não só a Reforma do século 16, mas também o movimento pietista, o puritanismo na Inglaterra, os avivamentos na América do Norte e na Europa, e o pentecostalismo na América Latina tiveram impacto na sociedade. Esses movimentos resultaram no engajamento da igreja com questões sociais e humanitárias de modo a transformar a sociedade.

Segundo, é justamente em época de violência, corrupção, conflitos e guerras que a igreja precisa ser mais ousada e eficaz na propagação da mensagem do evangelho. Os profetas denunciavam os erros e anunciavam esperança. Não se trata de uma pregação moralista ou de uma tentativa de impor normas bíblicas e cristãs nas leis civis, mas envolve viver e defender os valores do reino de Deus não só dentro da igreja como também fora dela. John Stott expressava essa ideia dizendo que a igreja deve servir de “contracultura” à sociedade moderna. Não significa transformar uma nação em um país cristão nem em eleger um presidente cristão, mas defender arduamente os valores do reino de Deus.

Terceiro, a Palavra precisa ser pregada ousadamente na própria igreja. Se a Palavra não é pregada na igreja, o próprio povo de Deus se corromperá. Infelizmente, há um enfraquecimento da pregação na igreja evangélica hoje. A exposição e ensino bíblico vêm sendo substituído por entretenimentos religiosos. Como disse A. W. Tozer há mais de 60 anos,

“Na maioria das igrejas evangélicas é comum agora oferecer ao povo, principalmente aos jovens, o máximo de entretenimento e o mínimo de instrução. Em muitos lugares raramente é possível ir a uma reunião cuja única atração seja Deus. Só se pode concluir que os filhos de Deus estão entediados dele, pois é preciso mimá-los com pirulitos e balinhas na forma de películas religiosas, jogos e refrescos” (A. W. Tozer)

No texto de Provérbios 29.18, a palavra “povo” refere-se à própria nação de Israel, por isso, aqueles que supostamente tinham o conhecimento de Deus, porém, corriam o risco de se corromper por não atentar ao que Deus tinha a dizer. A Bíblia “A Mensagem” representa bem essa ideia: “Quando as pessoas não conseguem ver o que Deus está fazendo, elas tropeçam em si mesmas; Mas, quando atentam para o que ele revela, são as mais abençoadas.”

Não há dúvida que vivemos uma profunda crise de integridade em nossa nação. Não podemos permitir que as Escrituras deixem de ser proclamadas e vividas pela igreja. Todos desejam transformações, desejamos uma sociedade mais justa e menos corrupta. A Palavra transforma os indivíduos e a sociedade, consequentemente, serve de sinal da presença do reino de Deus no mundo.

Nota:
1. Godfrey, Robert W. The marks of the church. Disponível neste link.


Pastor presbiteriano, doutor em Antigo Testamento e diretor acadêmico da Faculdade Teológica Sul-Americana, em Londrina (PR).

domingo, 8 de outubro de 2017

SOLA FIDE

Depois de tratar do SOLA SCRIPTURA, vamos tratar, agora, do segundo pilar da Reforma do Século XVI, o Sola Fide. A salvação é uma conquista das obras? A salvação é o resultado da parceria entre a fé e as obras? Ou a salvação é somente pela fé, independentemente das obras? Essa era a questão na época da Reforma e ainda hoje. A salvação não pode ser pelas obras, pois se assim fosse, o homem precisaria ser perfeito. A lei exige obediência completa (Lc 10.28). O padrão para entrar no céu é perfeição (Mt 5.48). A Bíblia, entretanto, diz que não há justo, nenhum sequer (Rm 3.10). Todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus (Rm 3.23). A Escritura chega a dizer que se você guardar toda a lei e tropeçar num único ponto, você se torna culpado de toda a lei (Tg 2.10). Logo, pelas obras da lei é impossível que o homem pecador seja salvo. De igual modo, a ideia de que o homem é salvo pela fé associada às obras é um contrassenso. A salvação não é uma realização do homem nem mesmo um esforço conjunto de Deus e do homem. O sinergismo, ou seja, a ideia de que o homem pode cooperar com Deus em sua salvação está em total desacordo com o ensino das Escrituras. O apóstolo Paulo é enfático: “O homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei” (Rm 3.28). E ainda: “Pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8,9). Destacaremos três pontos importantes para o melhor entendimento do tema:
Em primeiro lugar, somos salvos pela fé independentemente das obras (Rm 3.28). Somos salvos não pela obra que realizamos para Deus, mas pela obra que Deus fez por nós. Deus entregou o seu Filho. Ele morreu pelos nossos pecados. Sua morte substitutiva satisfez as demandas da lei e cumpriu os reclamos da justiça divina. Portanto, a base meritória da nossa salvação é o sacrifício de Cristo em nosso favor. Tomamos posse da oferta da graça pela fé. Recebemos essa salvação gratuita pela fé. A fé é a mão de um mendigo a receber o presente do Rei.
Em segundo lugar, somos salvos pela fé em Cristo e nele somente (At 16.31). A salvação não nos é dada pela fé na igreja, mas pela fé em Cristo. Essa fé não é apenas assentimento intelectual. Até os demônios creem e tremem (Tg 2.19) e eles não estão salvos. Também não é uma fé temporária, apenas para as coisas do aqui e do agora. Muitos confiam em Deus quando precisam de um socorro, mas terminado o problema, voltam novamente as costas para Deus. Essa fé se dissipa como uma neblina, por isso, não é a fé salvadora. A fé salvadora é uma confiança exclusiva na pessoa e na obra de Cristo. É confiar somente nele para a redenção. A Bíblia é enfática: “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At 4.12).
Em terceiro lugar, somos salvos pela fé para as boas obras (Ef 2.8-10). A fé e as obras não estão em oposição; complementam-se. A fé é a causa da salvação e as obras são a sua consequência. Somos salvos somente pela fé, independentemente das obras, mas a fé que salva nunca vem só. Não somos salvos por causa das boas obras; somos salvo para as boas obras. Somos justificamos pela fé, mas provamos essa justificação pelas obras. Por isso, a fé, se não tiver obras, por si só está morta (Tg 2.17). A verdadeira fé em Cristo é provada aos olhos dos homens pela prática das boas obras. Essas boas obras foram preparadas de antemão para que andássemos nelas (Ef 2.10), de tal forma que, o próprio Deus, que nos salvou pela fé em Cristo, é quem opera em nós tanto o querer como o realizar (Fp 2.13). A salvação é uma obra de Deus desde o seu planejamento até à sua consumação. Ele planejou, executou e consumará nossa salvação, que é recebida pela fé e demonstrada pelas obras.

Rev. Hernandes Dias Lopes

domingo, 1 de outubro de 2017

SOLA SCRIPTURA


O brado da Reforma Protestante ecoou de dentro da Escritura. A Reforma não foi a abertura de um novo caminho religioso, mas uma volta às antigas veredas. Não foi uma nova forma de ver a revelação divina, mas uma volta às Escrituras do Antigo e do Novo Testamento. Não foi a adoção de novas doutrinas, mas uma volta à doutrina dos apóstolos. O resgate da autoridade e da centralidade das Escrituras foi o pilar principal da Reforma. Destacaremos aqui quatro pontos importantes:
Em primeiro lugar, a Escritura é a única fonte que nos mostra o que devemos crer. A Bíblia é a nossa única regra de fé. A tradição não está em pé de igualdade com a Bíblia. Os dogmas e decisões dos concílios eclesiásticos precisam estar debaixo da autoridade da Bíblia. A igreja está sob a autoridade da Bíblia. Nenhum igreja ou concílio pode determinar o que devemos crer. O conteúdo de nossa fé vem da Palavra de Deus e dela somente. Nossa base doutrinária procede não da interpretação pessoal deste ou daquele teólogo, mas da Escritura. A Bíblia e só ela é a palavra de Deus infalível, inerrante e suficiente. Não aceitamos nenhuma revelação forânea às Escrituras. Não temos novas revelações. Mesmo que um anjo descesse do céu, para pregar outro evangelho, deveria ser rejeitado como anátema. A palavra de Deus jamais caduca nem fica obsoleta.
Em segundo lugar, a Escritura é a única autoridade que nos ensina o que devemos fazer. A Bíblia é a nossa única regra de prática. Nossa fé determina nossas ações. O que cremos pavimenta o caminho do que fazemos. A teologia é mãe da ética. O credo desemboca na conduta. Assim como um homem crê, assim ele é. Nossas experiências não suplantam a verdade revelada. A Bíblia regula e julga nossas experiências em vez de nossas experiências relativizarem a Bíblia. Não é o que eu sinto que é a norma do meu viver, mas o que Deus diz em sua palavra. Não é que a igreja diz em suas encíclicas ou dogmas que constitui o fundamento de nossas ações, mas o que está registrado na palavra de Deus. A verdade de Deus não é apenas um preceito a ser crido, mas também e, sobretudo, uma norma a ser praticada.
Em terceiro lugar, a Escritura é a única revelação divina que nos aponta para Jesus, o nosso Salvador. Tanto o Antigo como o Novo Testamento enfatizam a pessoa e a obra de Jesus Cristo. O Antigo Testamento mostra Deus separando um povo para si e por meio dele, preparando o mundo para a chegada do Messias. O Novo Testamento mostra como esse Messias veio e o que ele fez para salvar o seu povo. O Antigo Testamento mostra o Cristo da profecia; o Novo Testamento revela o Cristo da história. Patriarcas, profetas, reis e sacerdotes foram um tipo de Cristo. O tabernáculo, o templo, os rituais e as festas judaicas apontavam para Jesus. Tudo era sombra da realidade que se cumpriu em Jesus. Ele é o eixo das Escrituras, o centro da história, o Salvador do mundo. As Escrituras testificam de Jesus e apontam-no como o único nome dado entre os homens pelo qual importa que sejamos salvos.
Em quarto lugar, a Escritura é o único conteúdo da pregação da igreja. Não pregamos ao mundo palavras de homens, mas a palavra de Deus. Ela é inspirada, viva, eficaz e penetrante. Ela é inerrante em seu conteúdo, infalível em seu propósito e suficiente em sua mensagem. Não podemos tirar nada dela nem a ela acrescentar coisa alguma. Precisamos pregar toda a Bíblia e só a Bíblia. Não criamos a mensagem, apenas a transmitimos. A palavra é o conteúdo da nossa pregação. Ela é o trigo nutritivo da verdade. Ela é mais preciosa do que o ouro e mais doce do que o mel. É remédio para o enfermo, alimento para o faminto, água para o sedento e luz para o errante. Ela é a espada de dois gumes. Por ela avançamos contra as forças do mal e por ela nos defendemos dos ataques do inimigo. Sua mensagem é penetrante e sempre oportuna. A Escritura não pode falhar. Os céus bem como a terra passarão, mas a palavra de Deus jamais vai passar. Ela é eterna. Ela nos basta. Permanece o lema da Reforma: Sola Scriptura!

Rev. Hernandes Dias Lopes

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