O suicídio é uma questão importante de saúde pública. Setembro Amarelo
é uma campanha de conscientização sobre a prevenção do suicídio, que
tem como objetivo alertar a população a respeito da realidade do
problema no Brasil e no mundo, e discutir as formas de prevenção. A
prevenção precisa começar nas famílias, nas escolas e também nas
comunidades, como as igrejas.
Tamanho do problema
Segundo
relatórios da OMS (Organização Mundial da Saúde) e de Programas de
Saúde Mental, cerca de 1 milhão de pessoas cometem suicídio por ano. Nas
estatísticas de tentativas (suicídios não concretizados) este número
sobe para entre 15 a 25 milhões por ano. Para cada pessoa que comete
suicídio, cerca de seis a dez pessoas próximas sofrerão de adoecimento
emocional decorrente desta situação. Atualmente é a segunda maior causa
de morte entre jovens (15-29 anos), um alto índice também em idosos e
grupos populacionais que incluem pessoas que foram vítimas de violência.
Apesar de sua maior incidência ser em países de baixa renda e
desigualdade social, vem apresentando crescimento em países
desenvolvidos com o aumento de quadros depressivos e abuso de
álcool/drogas. O Brasil é hoje o oitavo país do mundo em número de
suicídios.
Tabu dentro e fora da igreja
O
tema da morte é historicamente um tabu ao ser abordado e em muitas
culturas é evitado a todo custo. Mas o custo do silêncio é alto. O tema
da “morte voluntária”, como no caso do suicídio, encontra ainda mais
estigma e dificuldade de abordagem, por ser muitas vezes atribuído
desordenadamente à temática da loucura, ou em círculos religiosos, ao
pecado.
Se o tema do suicídio é tabu em muitos ambientes e
culturas, imagine em comunidades cristãs! Muitas comunidades cultivam um
discurso triunfalista que busca afastar qualquer vestígio de sofrimento
e fragilidade, discurso que não condiz com o que realmente vivemos em
nossa jornada de discipulado, intimidade com Deus e transformação
contínua, tantas vezes permeada pela dor em um mundo caído. Outros
tantos atribuem cruelmente as fragilidades à falta de fé, agravando
ainda mais o quadro emocional.
O estigma, a vergonha, a
impotência, a dificuldade em se compreender os fenômenos em saúde
mental, as distorções teológicas que não abrem espaço para o diálogo.
Como seres humanos, não estamos imunes aos sofrimentos psíquicos e
angústias da alma. Leia sua Bíblia e encontrará uma diversidade de
pessoas em sofrimento e questionamento, vivendo todas estas situações na
companhia e amparo do Eterno.
Temos dificuldade em abordar
questões emocionais, da subjetividade, que por tantas vezes nos parecem
inacessíveis e inomináveis. Os sofrimentos de ordem psíquica mostram-se
multifatoriais, sejam desequilíbrios químicos, aspectos biológicos,
socioculturais e até mesmo “religiosos”.
Como comunidade cristã,
sofremos de maneira geral com a dificuldade de integração entre temas da
saúde mental e espiritualidade cristã, tão necessária e urgente nos
dias atuais. Precisamos incentivar o diálogo para auxiliar na prevenção
desta questão do suicídio, por exemplo, bem como de tantas outras que
assolam a saúde emocional. A depressão, a ansiedade, o burnout, os
transtornos de personalidade, o suicídio, o trauma, a violência, entre
outras questões, afetam pessoas de todas as nações, classes sociais e
crenças.
Afetam líderes e liderados, pastores e ovelhas.
Precisamos cuidar uns dos outros e de nossas lideranças, tantas vezes
exauridas em seus ministérios e necessitando de atenção e tempo
disponível para cuidar dos aspectos de sua saúde física, mental
,espiritual, etc. Precisamos atuar tanto na prevenção quanto no cuidado
com aqueles que já sofrem e os que são impactados pelas consequências
desta realidade.
O papel da comunidade
O
papel da comunidade no auxílio à prevenção é de singular importância
nestes processos de adoecimento multifatoriais. Não podemos caminhar
sozinhos em meio à dor. Quando a comunidade sai da postura da negação
(“isso não acontece com discípulos de Jesus” – quantas vezes escuto
isto...) e as pessoas se percebem humanas, frágeis, parte de um mundo
caído e que necessita de restauração e ressurreição interior, aí sim,
começamos a dialogar. Quando nos percebemos tão necessitados da Graça de
Deus e tão dependentes Dele, buscando sentido para a vida e razão para a
existência, nos aproximamos do sofrimento do próximo com uma escuta
mais amorosa e misericordiosa. Quando nos tornamos conscientes acerca
destas questões, a comunidade se torna um espaço potencial que pode
promover cuidado e restauração. A construção de vínculos de apoio mútuo,
o senso de pertencimento, o contexto para a busca de sentido da vida e o
espaço frutífero para nutrir a esperança, desfrutando da intimidade de
Deus e uns dos outros.
Precisamos da comunidade de amigos e
irmãos que nos incentivem na vida devocional, nos integrem em serviço ao
próximo. Comunidade que esteja atenta para discernir os sinais de
adoecimento psíquico e fatores de risco. Que respeite as fragilidades,
que caminhe na direção do outro com ação e oração. O primeiro passo é
nossa abertura para ouvir sobre estes temas e falar abertamente sobre
eles. Esta realidade está presente em todas as nossas comunidades.
É
importante pontuar que precisamos reconhecer nossos limites. Deus age
de diversas maneiras. Precisamos de abertura às parcerias e
encaminhamentos, agregando todos os recursos que Deus nos doou e
disponibilizou nas diferentes áreas de conhecimento e atuação, para que o
cuidado seja integral. Somos seres bio-psico-sociais-espirituais e
precisamos cuidar de todos estes aspectos que compõe o todo. Sejam
líderes, membros da comunidade, psicólogos, psiquiatras, terapeutas
ocupacionais, etc, todos contribuindo para que este cuidado seja mais
amplo e eficaz.
Saiba mais sobre o Setembro Amarelo
• Karen Bomilcar
é psicóloga clínica hospitalar, mestre em Teologia e Estudos
Interdisciplinares pelo Regent College (Canadá). Atualmente reside em
São Paulo (SP) onde serve no discipulado e cuidado pastoral de pessoas
de diversas comunidades cristãs.
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