Na Bahia, um dos elementos culturais que parece ter se inserido como fortalecedor desta sanha pelo enfrentamento violento é a música conhecida – sem muito rigor teórico-musical – por “pagode” ou “pagodão”, uma espécie de derivação da Axé Music com bastante apelo a batidas percussivas e letras geralmente incitadoras de aa lgum tipo de violência (inclusive sexual, principalmente degradadora da condição feminina). A refrão abaixo, por exemplo, parte da canção “Dedo calibrado”, da banda “A Bronkka” parece sugerir e incentivar o contexto da troca de tiros:
“Por isso quando eu desço,Um outro clássico da mesma banda é intitulado “Ele desce murro no queixo“, e tem como refrão o trecho “Ele pode ser alto grande ou o que for/Panca no queixo ele desce”.
É dedo calibrado,
É sangue no olho,
Comigo é mais em baixo
Se é pra é trocar
Vamos trocar, vamos trocar
Se é pra trocar, vamos trocar
Vamos trocar”
A banda Black Style, por sua vez, grande sucesso nas rádios e festas populares da Bahia, se destaca por tematizar a condição feminina, geralmente de modo questionável do ponto de vista da dignidade. O refrão da canção “Balance o rabinho cachorra” é bem sintomático:
“Procurei por minha cachorraO Robyssão que a música se refere é o vocalista da banda, que recentemente deu a seguinte declaração para o jornal Correio (posteriormente amenizada por sua assessoria):
Ninguém sabe, ninguém viu
Olhei de baixo da mesa, procurei lá no canil
Ela saiu da coleira, deve tá no pagodão
Balance o rabinho chamando atenção, no assovio do Robyssão
[...]
Balance o rabinho cachorra
Balance o rabinho cachorra”
“Eu percebi que o meu público, o público do pagode, sempre admirou a vida do crime. O cara que é gângster, tem vontade de pegar uma grana, pegar dez mulheres e tal. Então quando criei esse personagem, o público se identificou”Note-se, a propósito, que alguns dos músicos das bandas que cantam este estilo se envolveram em fatos bem semelhantes ao que pregam suas músicas, como o caso do ex-vocalista da banda “A Bronkka” que é suspeito de ter praticado dano às instalações de um hotel quando estava acompanhado de menores, e o célebre caso da banda New Hit, que mesmo indiciados por estupro a fãs menores continuam fazendo shows.
Sim, discursos artísticos, como outros elementos simbólico-culturais, podem se converter em violência, motivo pelo qual certas composições e apologias são questionáveis do ponto de vista qualitativo. Há canções que não servem para nossos jovens, que degradam as meninas, e incentivam o pior modo possível de resolução de conflitos para os meninos. O que fazer, já que esta arte é largamente consumida por nossas periferias?
Me parece que devemos caminhar no sentido da afirmação do estilo, que não é positivo nem negativo, já que esta definição depende do senso estético (vide o Olodum, que bem usa o Samba Reggae em prol dos jovens de periferia em Salvador), qualificando as mensagens que esta música traz consigo. O pagode baiano já agrada a juventude, restando então apenas que o Estado, mediante políticas culturais, positive as intenções embutidas em seu conteúdo semântico. Já pensaram em uma oficina de instrumentos e letras de pagode baiano?
PS: No Rio, o Funk virou movimento cultural. O pagode da Bahia devia alcançar o mesmo status.
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