O grito do nosso “libertador” ecoa nas veias de seus súditos. Um povo se ergue para exigir sua independência – e se torna mais preso do que nunca. Atualmente, palavras muito similares são sussurradas diariamente a nossos ouvidos. O homem pós-moderno foi criado sob o paradigma da autonomia como uma meta desejável – senão inegociável – e, na ânsia por um viver libertador, se viu mais preso que nunca.
Não se pode negar, no âmbito do desenvolvimento humano, a importância da independência, mas é igualmente inegável a supervalorização da mesma na contemporaneidade. O mito do homem autônomo o tornou adorador de si mesmo, incapaz, muitas vezes, de praticar a disciplina da submissão.
O homem superindependente sente-se agredido quando confrontado; questiona constantemente seus superiores; desconstrói e relativiza regras. Gradativamente, a imagem que projeta de si mesmo faz sombra àqueles que o cercam, tenham eles autoridade reconhecida socialmente ou não. O homem pós-moderno regrediu à forma do primeiro homem: o Adão autônomo.
O projeto de autonomia de Adão nos trouxe todas as mazelas que conhecemos – principalmente a morte. E o mesmo projeto é reproduzido fielmente nos corações de homens e mulheres de hoje. Faz-se necessário pôr à terra as estátuas de autoidolatria que erguemos, além de lembrar que da mesma terra somos formados.
Jesus nos convida constantemente a reconhecer nossa própria pó-breza: nos lembra que não temos controle sobre as circunstâncias que nos envolvem e nos desafia a diariamente sacrificar nosso ego em favor de uma vontade maior. Enquanto não compreendermos a exata dimensão de nossa fragilidade, não seremos capazes de estar do lado humilhante de uma relação de submissão.
Um hábito que deriva dessa premissa é o discipulado, do qual temos inúmeros exemplos nos textos bíblicos. A relação mestre-discípulo está presenta nas histórias de Elias e Eliseu, Barnabé e Paulo, Jesus e os doze, entre tantas outras. O discípulo devia acolher as palavras e exemplos do mestre, não obstante a dificuldade; ir onde quer que o mestre fosse; obedecer a tudo que o mestre ordenasse.
Se a relação de submissão se dá em parâmetros saudáveis, perceberemos o que acontece em todas as histórias já citadas: o discípulo desenvolve autonomia suficiente para tornar-se eventualmente mestre sem ser consumido pela egolatria. Ao contrário do projeto de autonomia de Adão, a submissão saudável – embora inicialmente um ato de dependência – desenvolve todo o potencial do ser humano, gera vida.
Como mencionado, o discípulo deve reproduzir o mais fielmente possível os passos do mestre. E nosso mestre supremo foi, acima de tudo, submisso. Nas palavras de Paulo, Jesus “embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!”. A nós, o pedido é simples: “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus”.
Resta-nos escolher: dependência e vida; ou independência e morte.
- Levi Agreste, 25 anos, graduado em Letras pela Unicamp, leciona em três escolas da região metropolitana de Campinas, faz parte da coordenação da ONG Soprar e escreve no blog umanovaviagem.
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